Introdução à Liturgia Bizantina
Monsenhor Pedro
Arbex
(sacerdote e teólogo
melquita católico)
Eterna seja sua
memória!
1. Introdução
Sacrifício e Sacramento
A missa é o ato litúrgico durante o qual renova-se de
modo místico e incruento o sacrifício cruento de Cristo na Cruz; e
administra-se aos fiéis, pela Eucaristia, o alimento espiritual para as suas
almas. Na missa, portanto, celebra-se não somente um sacramento, o maior dos
sacramentos, mas renova-se também um sacrifício, o verdadeiro e perpétuo
Sacrifício da Nova Aliança.
A Eucaristia é sacrifício,
enquanto se oferece; é sacramento, enquanto se recebe.
Sacrifício em geral
O sacrifício é a oferta
voluntária de uma coisa sensível que é destruída, se for um ser inanimado, ou
imolada, se for um ser animado; feita por um ministro legítimo, a Deus só, para
reconhecer seu domínio absoluto e, no caso de pecado, para aplacar sua justiça
e obter a reconciliação e a união com ele.
O sacrifício, que é o ato de
culto mais característico e mais sublime, deriva da dupla obrigação do homem
para com Deus: a nossa dependência absoluta d'Ele, como criaturas; a nossa
inimizade com Ele, como pecadores.
A necessidade do sacrifício
como reconhecimento da nossa dependência de Deus sempre existiu, mesmo no
estado de inocência de nossos primeiros pais, no paraíso terrestre, antes da
queda: Adão e Eva, mesmo se não tivessem pecado, teriam de oferecer sacrifícios
a Deus, em sinal de submissão e de gratidão. Quando, porém, o pecado abriu um abismo
entre Deus e o homem, o sacrifício assumiu uma segunda finalidade, tornando-se
o meio de reconciliação. O sacrifício, enquanto expiação do pecado, tem o
caráter de representação ou substituição.
2. O ministro do sacrifício
deve ser legítimo. O sacrifício é um ato de culto público. Ninguém pode
cumpri-lo se não tiver títulos para falar ou agir em nome da sociedade. Na Lei
evangélica como na Lei mosaica (e até entre os pagãos) somente os sacerdotes
são delegados para esta missão.
3. O fim, o escopo do
sacrifício, é reconhecer o absoluto domínio de Deus e aplacar sua justiça, se o
ofendemos.
Pela criação existe entre o
Criador e sua criatura um laço que os liga um ao outro: laço de soberania da
parte do primeiro, e laço de dependência da parte do segundo. O sacrifício é o
ato pelo qual exprimimos esta relação e proclamamos, de um lado, a infinita
grandeza de Deus, e, de outro, o nosso nada, a nossa pequenez; e no caso de
natureza decaída, nossa ingratidão e nosso arrependimento.
A coisa essencial num
sacrifício é dar ou renunciar a um objeto de valor (valor em si ou para quem
dá), por amor de Deus. Para dar a esta oferta todo o seu significado, os homens
costumavam destruir o objeto sensível: esta destruição impedia que se pudesse
voltar a possuir aquele objeto e com isto se exprimia a verdade seguinte: que
não somos nada diante de Deus.
A dádiva oferecida ocupava o
lugar do homem. Por isso aquele que fazia a oferta colocava, muitas vezes, a
mão sobre o animal sacrificado, e fazia-se aspergir com o sangue ainda quente e
fumegante da vítima. Assim fizeram Abel, Caim, Noé. Abel imolou e queimou as
primícias dos seus rebanhos; Caim, seu irmão, queimou os frutos da terra; Noé
matou e queimou animais à saída da arca.
Sacrifícios sangrentos e
não sangrentos
Todos os povos e todas as
religiões tiveram seus sacrifícios. Aparecem já praticados pelos filhos dos
nossos primeiros pais, Caim e Abel (Gn 4), e achamo-los em todas as épocas
entre os pagãos e os judeus. Egípcios, Caldeus, Assírios, Persas, Gregos,
Romanos etc. ofereciam sacrifícios a seus deuses para aplacá-los ou para
implorar seu auxílio. Chegaram até a imolar seres humanos. Sabemos, pela Sagrada
Escritura, que o rei dos Moabitas, para escapar ao cerco do rei de Israel,
imolou seu filho primogênito. Os Fenícios e outros povos da Ásia sacrificavam,
todos os anos, crianças a Moloc, o deus do fogo com cabeça de touro. "O
que os pagãos imolam, escrevia São Paulo aos Corintios, imolam-no aos demônios
e não a Deus" (1Cor 10,20).
A humanidade, mesmo envolta
nas trevas da ignorância e da perversão, sempre sentiu a necessidade de
oferecer sacrifícios à divindade, ainda que confundindo o verdadeiro Deus com
os falsos ídolos. Em Atenas, no tempo de São Paulo, não havia entre os inúmeros
altares um altar ao "Deus desconhecido"?
Havia sacrifícios cruentos e
sacrifícios incruentos (sangrentos e não sangrentos). Os primeiros consistiam
na imolação, no derramamento do sangue de uma vítima escolhida no reino animal
(bezerros, carneiros, ovelhas, cabras, rolas e até seres humanos). Nos
segundos, em que não se derramava sangue, as ofertas eram escolhidas no reino
vegetal e podiam ser objetos sólidos (trigo, farinha, pão, frutos da terra
etc.), ou líquidos (vinho, azeite). Os sólidos eram queimados e os líquidos
derramados ao pé do altar. Oferecia-se também incenso.
Sacrifícios do Antigo
Testamento ou da Lei Mosaica
Os sacrifícios dos pagãos não
eram senão tentativas para chegar ao verdadeiro sacrifício de expiação ou de
ação de graças à divindade: ofereciam animais sem defeitos físicos, crianças
inocentes ou produtos escolhidos da terra, para serem vítimas perfeitamente
imaculadas e, portanto, agradáveis aos deuses. Quando Deus escolheu para si,
nos descendentes de Abraão, um povo eleito, do meio do qual ia nascer o
Salvador do gênero humano, ele próprio fez a Moisés, após a saída do Egito,
numerosas prescrições sobre os sacrifícios que lhe deviam ser oferecidos, enquanto
durava a Antiga Aliança.
"No Antigo Testamento
tudo era coberto de sangue como figura do sangue de Jesus Cristo que nos devia
purificar" (Bossuet). Pela Bíblia sabemos que os judeus tinham três tipos
de sacrifícios: os holocaustos, os sacrifícios de expiação e os sacrifícios
pacíficos.
1. No holocausto (gr.: ólos,
inteiro; e caústos, queimado), chamado também "sacrifício perfeito",
a vítima era imolada e inteiramente consumida pelo fogo sobre o altar.
Demonstrava-se assim o domínio absoluto de Deus sobre suas criaturas,
representadas pela vítima. No Templo de Jerusalém, único lugar onde se podiam
oferecer sacrifícios, todo dia ao nascer do sol e à tarde imolava-se um
cordeiro que devia ser queimado por completo; e aos sábados, em vez de um,
sacrificavam-se dois cordeiros pela manhã e dois à tarde. Ao mesmo tempo, no
altar dos perfumes, um outro sacerdote queimava incenso sobre o braseiro que
ali se encontrava. É esta última função que desempenhava Zacarias, quando lhe
apareceu o anjo para lhe anunciar que teria um filho, "a quem porá o nome
de João" (Lc 1).
2. Os sacrifícios expiatórios
destinavam-se a aplacar a cólera do céu, a expiar os pecados do povo, e a
purificá-lo das suas iniqüidades. Destas vítimas, uma parte era queimada sobre
o altar e outra ficava reservada para o sustento dos sacerdotes. Cada ano os
judeus celebravam a festa da expiação (Yom Kippur). Neste dia o sumo sacerdote
oferecia em holocausto um touro para a expiação de seus próprios pecados e dos
pecados da sua família; e um bode oferecido pelo povo, para a expiação dos
pecados da comunidade. Em seguida, pondo suas mãos sobre a cabeça de um segundo
bode vivo oferecido também pelo povo, carregava-o de todos os pecados da nação
e o expulsava para o deserto, levando assim simbolicamente para longe de Deus
as iniqüidades de seu povo (bode expiatório). No dia da sua purificação, isto
é, 40 dias após o nascimento de Jesus, Maria e José, em obediência à lei,
"levaram o menino a Jerusalém para o apresentarem ao Senhor, e para
oferecerem em sacrifício (de expiação) um par de rolas ou dois pombinhos"
(Lc 2,22-24).
3. Os sacrifícios pacíficos
tinham por finalidade dar graças a Deus pelos bens e dons recebidos, pedir-lhe
uma graça ou cumprir uma promessa: após a imolação da vítima, uma parte dela
era queimada no altar; uma outra reservada aos sacerdotes e uma terceira
consumida, num convívio sagrado, pela pessoa que mandou oferecer o sacrifício e
pelos membros de sua família. Esta refeição figurava a Eucaristia.
Além dessas três espécies de
sacrifícios sangrentos, havia os sacrifícios não sangrentos, ou oblações, que
acompanhavam obrigatoriamente os holocaustos e os sacrifícios pacíficos, ou
podiam ser feitos isoladamente. A matéria oferecida era uma substância, sólida
ou líquida, mais freqüentemente incenso, farinha (misturada com sal e azeite),
ou vinho. Todos estes sacrifícios não eram senão figura do verdadeiro
Sacrifício da Nova Aliança selada pelo sangue de Cristo. Por isso cessaram,
conforme os profetas o tinham anunciado, depois do Sacrifício do Calvário: o
símbolo deve ceder o lugar à realidade, como a noite à luz.
São Paulo, na sua Epístola
aos Hebreus, (9,11), diz a esse respeito: "Cristo veio como Pontífice dos
bens futuros; e passando por um tabernáculo mais excelente e perfeito, não
feito por mão do homem, quer dizer: 'não deste mundo', entrou no santuário não
pelo sangue de bodes ou de bezerros, mas pelo seu próprio sangue, e de uma vez
para sempre, porque alcançou a redenção eterna. Ora, se o sangue dos cabritos e
dos touros e a aspersão da cinza duma novilha santifica os impuros pela
purificação da carne, quanto mais o sangue de Cristo, que, pelo Espírito Santo,
se ofereceu sem mácula a Deus, purificará a nossa consciência das obras mortas,
para servirmos ao Deus vivo!"
Sacrifício da Nova Aliança
Na Nova Aliança, há um só
sacrifício: o sacrifício que Jesus Cristo instituiu na última Ceia, consumou no
dia seguinte sobre a Cruz e que a Missa renova todos os dias.
Jesus, Sacrificador
e Vítima
Nos sacrifícios antigos o
sacerdote era distinto da vítima. Escolhiam como vítima, nos sacrifícios
cruentos, considerados os mais perfeitos, um ser vivo, de preferência um animal
doméstico, que, por pertencer ao homem, podia legitimamente substituí-la.
Ofertavam-no a Deus, separando-o de todo uso profano, para consagrá-la ao
serviço e à honra da divindade. Imolavam-no em seguida, a fim de mostrar que o
pecador, tendo ofendido a Deus, não tinha mais o direito de viver, que merecia
a morte. Em certos sacrifícios, após ter queimado uma parte da vítima, comiam a
outra parte, para comungar assim à vítima e, por meio dela, à divindade.
Porque, após a glorificação de Deus, a união com ele, quebrada pelo pecado, era
o fim para o qual tendia o sacrifício.
Portanto, três atos
principais constituíam o sacrifício: o oferecimento, a imolação e a comunhão
que se chamava também consumação. Tudo isto não eram senão figuras ou símbolos
que preparavam o sacrifício verdadeiro, o sacrifício que devia oferecer o
Homem-Deus, o Sumo Sacerdote da nova Lei, para glorificar a Deus e salvar seus
irmãos. Ora, Deus tem direito a homenagens infinitas; para render-lhe tais
homenagens e reparar a ofensa a ele feita pelo pecado, era necessário um
sacrifício de valor moral infinito. E, para que assim seja, Jesus, nosso Sumo
Sacerdote, quis ser não somente o sacrificador, mas também a vítima. Só deste
modo, sob este duplo aspecto, o sacrifício oferecido por ele teria
verdadeiramente um valor infinito, pois a dignidade de um sacrifício depende da
dignidade da pessoa que o oferece e da vítima oferecida. Ora, Jesus, sacerdote
e vítima, não é outro senão o Homem-Deus, isto é, uma pessoa infinita.
Desde o primeiro instante de
sua encarnação no seio virginal de Maria, Cristo se ofereceu a seu Pai como
vítima para substituir todos os holocaustos. Lemos na Epístola aos Hebreus
10,5-6: "Entrando no mundo, Cristo diz: 'Tu não quiseste sacrifício nem
oblação, mas me deste um corpo. Os holocaustos pelo pecado não te agradam.
Então eu disse: eis que venho para fazer, ó Deus, a tua vontade"'. E toda
a sua vida foi uma cruz e um martírio, orientada para a imolação final que
constituíra o ato essencial de seu sacrifício. Sua imolação como vítima começa
com sua Paixão, no Jardim da Agonia, para terminar no Calvário. Mas, antes de
se deixar imolar pelos algozes, Jesus quis de novo oferecer-se como vítima e,
desta vez, num verdadeiro sacrifício, acompanhado de ritos misteriosos, o
sacrifício da última Ceia. "Tomai e comei, este é o meu Corpo, dado por
vós." "Bebei todos, porque este é o meu sangue, o sangue da Nova Aliança,
que é derramado por vós para a remissão dos pecados."
No Jardim das Oliveiras,
vendo-se carregado dos pecados dos homens, submerso pelas águas turvas de todas
as iniqüidades humanas e isto diante do Deus de toda santidade, uma tristeza
mortal apodera-se de sua alma e um suor de sangue corre-lhe ao longo do corpo.
Gostaria de ver longe dele este cálice de amarguras, mas submete-se à vontade
de Deus: "Meu Pai, se é possível, permiti que passe de mim este Cálice;
faça-se, contudo, não como eu quero, mas como vós quereis" (Mt 26,39).
Traído por Judas, renegado
pelo chefe dos doze, abandonado por quase todos os seus discípulos,
esbofeteado, injuriado pelos servos do sumo sacerdote, condenado pelo Sinédrio
por ter-se proclamado o Filho de Deus, condenado por Pilatos que, no entanto,
momentos antes tinha proclamado sua inocência, flagelado, coroado de espinhos e
carregando uma pesada Cruz, sobe penosamente o monte Calvário, estende seus
membros doloridos, vê seus pés e suas mãos traspassados pelos cravos, ouve os
insultos e as zombarias dos chefes de seu povo, Escribas e Fariseus; e em vez
de se vingar, como bem poderia fazer, pede a seu Pai que lhes perdoe, porque
não sabem o que fazem. Ele é o Bom Pastor que dá sua vida por suas ovelhas,
conforme tinha dito: "Eu sou o Bom Pastor; o Bom Pastor dá sua vida por
suas ovelhas... Ninguém me tira a minha vida, mas eu a entrego por mim mesmo;
tenho o poder de entregá-la e tenho o poder de retomá-la novamente. Este é o
mandamento que recebi de meu Pai" (10 10). Cumprido o mandamento, pôde
exclamar: "Está tudo consumado". Só lhe falta permitir à morte levar
sua vítima voluntária, e o fez oferecendo-se pela última vez a seu Pai como
vítima de propiciação. "Pai, em vossas mãos entrego meu espírito" (Lc
23,46). Dizendo isto, expirou; e Deus foi glorificado como jamais o tinha sido;
e os homens foram salvos.
Os antigos, após a imolação
da vítima, desejavam um sinal que comprovasse ter sido a oferta aceita por
Deus. Às vezes o Senhor enviava o fogo do céu para consumir a vítima que,
então, se elevava ao céu como um sacrifício de agradável odor (ver Elias).
Houve algo de análogo após a imolação do Calvário. Em vez de enviar o fogo do
céu, para consumir a vítima, Deus ressuscitou seu Filho, conferindo a seu corpo
glorioso um poder santificador que se exercerá pela Eucaristia, banquete
sagrado pelo qual entramos em comunhão com a vítima e por meio desta com Deus a
quem foi oferecida.
Quarenta dias após sua
ressurreição, Cristo subiu glorioso ao céu, de corpo e alma, para assentar-se à
direita do Pai, onde, continuamente, advoga a nossa causa e intercede por nós.
São Paulo, após ter observado que os sacerdotes da Lei antiga tinham
necessidade de sucessores porque eram mortais, acrescenta: "Mas Este
(Cristo) como permanece para sempre, possui um sacerdócio eterno. E por isso
pode salvar perpetuamente os que por ele chegam a Deus; está sempre vivo para
interceder por nós. Tal é, com efeito, o Pontífice que nos convinha: santo,
inocente, imaculado, segregado dos pecadores e mais elevado do que os céus; que
não precisa, como os outros sacerdotes, oferecer diariamente sacrifícios, em
primeiro lugar pelos seus pecados, depois pelos do povo; porque isto o fez uma
vez por todas, oferecendo-se a si mesmo" (Hb 7,24-27).
Sacrifício
Eucarístico
Na noite em que foi entregue,
no decorrer da Ceia pascal, o Senhor Jesus tomou o pão e, depois de ter dado
graças, o abençoou, partiu e deu a seus discípulos, dizendo: "Tomai e
comei, isto é meu corpo que é entregue por vós". Do mesmo modo, tomou o
cálice, deu graças e entregou-lhes, dizendo: "Bebei dele todos, porque
isto é o meu sangue, sangue da Nova Aliança, que vai ser derramado por vós e
por muitos para a remissão dos pecados". E acrescentou: "Fazei isto
em memória de mim".
O Cordeiro que os judeus
imolavam não era senão o símbolo do verdadeiro Cordeiro de Deus que veio
imolar-se para tirar os pecados do mundo. Sem dúvida, somente no dia seguinte,
este Cordeiro será imolado de modo sangrento na Cruz; mas na Ceia ele está já
oferecido como vítima destinada com antecedência à morte; Jesus se oferece como
vítima aceitando livremente a morte que lhe será imposta, no dia seguinte;
oferece de maneira ritual e mística a imolação que, no dia seguinte, será
realizada de maneira visível e sangrenta; doravante sua vida não lhe pertence
mais, Ele a entregou já para a salvação do mundo.
Assim, o Salvador é sacerdote
segundo a ordem e o ritual de Melquisedec; este último ofereceu a Deus em
sacrifício pão e vinho; Jesus, na última Ceia, ofereceu-se a Si próprio, sob as
espécies do pão e do vinho, tornando assim realidade o que o salmista tinha
predito, há muitos séculos: "O Senhor fez juramento e não se arrependerá:
Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec" (SI 109,4).
Após ter convertido o pão e o vinho em seu corpo e em seu sangue, Jesus disse a
seus discípulos: "Fazei isto em memória de mim". Com estas palavras,
deu-lhes o poder de consagrar seu corpo e seu sangue, e impôs-lhes o dever de
se lembrarem d'Ele. São Paulo nos explica de que maneira se faz essa lembrança:
"Todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice, anunciareis
a morte do Senhor" (1 Cor 11 ,26). É, pois, Jesus Crucificado que a
Eucaristia nos lembra; é seu corpo partido, seu sangue derramado!
A Missa durante a qual a
Eucaristia é consagrada é, portanto, um memorial da Paixão de Cristo, de Cristo
agonizando, de Cristo morrendo por nós; é também uma representação viva do
sacrifício da cruz: o sacerdote é o mesmo, a vítima também. O Sumo Sacerdote da
Nova Lei, ou melhor, o único Sacerdote, é Jesus Cristo. E se na Missa Ele se
oferece pelo ministério dos sacerdotes, é unicamente porque ele assim quis
fazer depender sua presença no altar da vontade e da ação de um homem. O
sacerdote não é sacerdote senão em dependência de Cristo, e só age como seu
representante. Na consagração ele diz: "Isto é meu corpo, isto é meu
sangue" e não isto é o Corpo de Cristo, isto é o sangue de Cristo. Assim
como a última Ceia foi um verdadeiro sacrifício porque oferecia a vítima que ia
ser imolada no dia seguinte, assim também a Missa é um verdadeiro sacrifício,
porque renova a oferta da vítima já imolada no Calvário.
Cumprindo a ordem do Senhor:
"Fazei isto em memória de mim", os Apóstolos e depois deles os seus
sucessores, os bispos e os sacerdotes, têm sempre oferecido este sacrifício. No
tempo dos Apóstolos, os cristãos já se reuniam para o que chamavam "a
fração do pão" especialmente ao domingo. Nos Atos dos Apóstolos, lemos no
capítulo 20: "No primeiro dia da semana, quando nos reunimos para partir o
pão..."São Paulo diz muitas vezes que benziam e bebiam o cálice e que
partiam e comiam o pão: "O cálice de bênção, escreve ele aos Corintios,
que consagramos não é, porventura, a comunhão do sangue de Cristo? E o pão que
partimos não é a comunhão do Corpo do Senhor?" (lCor 10,16).
A Missa Através dos Tempos
Nos tempos apostólicos:
Sobre a celebração da Missa
nos tempos apostólicos, encontramos algumas informações nos Atos dos Apóstolos,
e nas Epístolas de São Paulo. Não nos fornecem, porém, uma descrição completa
da liturgia primitiva, mas somente alusões ou referências esparsas que,
juntadas, nos permitem, a certo ponto, ter uma idéia da maneira como os
Apóstolos e seus primeiros sucessores celebraram a liturgia. Dizemos "a
certo ponto", porque naquela época não havia ainda ritos rigorosamente
unificados, determinados com antecedência e dados por oficiais e obrigatórios.
Os cristãos de origem judaica
continuam durante um período não muito breve, a tomar parte no serviço
religioso que se realizava no Templo de Jerusalém ou nas sinagogas, promovendo,
porém, reuniões próprias, em casas particulares, para render a Deus o culto de
acordo com sua nova fé. E, quando se afastaram definitivamente da sinagoga, não
deixaram de seguir a mesma ordem que os judeus no serviço religioso, ou seja:
leituras da Bíblia com uma homilia sobre o texto lido, canto dos salmos e
orações. Esta parte herdada dos judeus - constitui o núcleo da primeira parte
da nossa missa, conhecida como "Liturgia dos Catecúmenos" ou
"Liturgia da Palavra". A este serviço religioso da Sinagoga, foram-se
acrescentando elementos novos próprios às reuniões cristãs, que são:
1. O Ágape ou Ceia Fraternal
que os cristãos tomavam no início das suas reuniões e do qual fala São Paulo em
sua primeira epístola aos Corintios 11,20-21.
2. Certas manifestações de
carismas ou dons espirituais que acompanhavam nos primeiros anos do
cristianismo a efusão do Espírito Santo, como o dom da profecia e das línguas
(1 Cor 12,13,14). O dom das línguas era a capacidade de falar em línguas
desconhecidas até daquele mesmo que falava. Em excesso de entusiasmo e de
gestos, o glossólago* cantava os louvores a Deus. Claro que não aproveitava ao
próximo. Mas, como dava muito na vista, era muito desejado dos Corintios.
Profecia, aqui, é sobretudo a pregação inspirada para "edificar, exortar e
consolar". Por suas funções de utilidade comum, o Apóstolo lhe confere
primazia sobre o dom das línguas. "Desejo que todos vós faleis línguas;
mais ainda que profetizeis. Pois quem profetiza é superior a quem fala línguas
- a não ser que ele traduza, para que a Igreja receba edificação" (14,5).
"Se dizes um louvor só
em espírito, como poderá o não iniciado dizer o Amém à tua ação de graças.
Porque ele não sabe o que dizes. Tu darás muito bem graças, porém o outro não
se edifica. Dou graças a Deus que falo em línguas mais do que todos vós; porém,
na Igreja, prefiro falar dez palavras inteligíveis para instruir aos outros do
que dez mil palavras em línguas (estranhas)" (14,16-19). [...]
O Ágape e a manifestação dos
carismas desapareceram rapidamente da Igreja por causa do desvirtuamento da sua
finalidade: com efeito, no início os fiéis mais ricos traziam o necessário para
a mesa, a que todos se assentavam como irmãos, numa demonstração de unidade e
caridade cristã. Logo, porém, surgiram os abusos que o Apóstolo censura: não
punham mais em comum, mas cada um comia o que levava; e os pobres, que nada
podiam levar, ficavam com fome e humilhados; houve também excessos na bebida e
desordens na manifestação dos carismas.
São Paulo censura nos
Corintios os abusos aos quais se entregaram, lembrando-lhes que não lhes
ensinou a promover banquetes dominados pelo egoísmo e pela desordem, mas sim a
fazer o que o Senhor Jesus fez na noite em que foi entregue, isto é, que
competia àquele que preside a reunião tomar pão, benzê-lo, parti-lo,
consagrá-lo com as mesmas palavras que Cristo pronunciou, comungar dele e
distribuí-lo aos fiéis; e fazer o mesmo com o cálice.
Para dar uma significação
mais clara a estes ritos e sobretudo para fazer compreender mais facilmente o
verdadeiro sentido das palavras "isto é meu corpo..., isto é meu sangue...",
o celebrante fazia a narração dos atos pelos quais Cristo instituiu a
Eucaristia, na última Ceia, de modo que as palavras "isto é meu corpo, ...
isto é meu sangue..." vinham em seu lugar como pronunciadas por Cristo
pela boca do sacerdote (presbítero).
O preceito do Senhor:
"Fazei isto em memória de mim", acrescentado após a consagração do
cálice, dava ensejo à recordação da Paixão, da Morte, da Ressurreição e da
Ascensão do Cristo ao céu.Com efeito, por estes mistérios o Salvador se
ofereceu em sacrifício a Deus Pai. Assim também o celebrante, reproduzindo
estes ritos e recordando estes mistérios, oferecia a mesma vítima ao Pai. Eis a
origem natural da oração que segue as palavras da consagração em todas as
liturgias: e anamnese (ou lembrança): Lembrando-nos deste [...].
Para a época que seguiu a
morte dos Apóstolos, um dos documentos mais antigos e mais interessantes é uma
apologia dos cristãos escrita por São Justino, que morreu em 165. Entre 150 e
155 dirigiu ele ao imperador Romano Antonino sua primeira apologia na qual
descreve o que se pratica nas assembléias cristãs, a fim de mostrar que as
atrocidades que lhes são atribuídas pelos pagãos são puras calúnias. Nele
refere-se duas vezes às celebrações eucarísticas. Não nos transmite um texto completo
da liturgia nem fórmulas de orações ou de exortações eucarísticas, mas a
seqüência detalhada dos atos praticados nestas assembléias e a maneira como era
celebrada a Eucaristia em Roma e nos países onde ele viveu, a Palestina (onde
nasceu) e o Egito.
Eis sua descrição de uma
reunião dominical:
No dia dito do sol (domingo)
reúnem-se em um mesmo lugar todos os cristãos, os que residem nas cidades e os
que residem no campo.
O leitor lê trechos tirados
das memórias dos Apóstolos (Novo Testamento) e dos livros dos Profetas (Antigo
Testamento).
Terminada a leitura, aquele
que preside toma a palavra para explicar aos presentes o que foi lido e
exortá-los a pôr em prática tão belos ensinamentos (homilia).
Em seguida, levantamo-nos
todos e dirigimos a Deus orações e súplicas (súplica insistente ou ecteni, após
o Evangelho).
Suspendendo as orações,
abraçamo-nos uns aos outros (Ósculo da paz).
Depois levam àquele que
preside a reunião dos irmãos em Cristo, pão e um cálice contendo vinho,
misturado com água (Procissão do ofertório).
O Presidente toma o pão e o
cálice, louva e glorifica o Pai do universo em nome de seu Filho e Espírito
Santo; dirige-lhe abundantes ações de graças por ter-se dignado dar-nos estes
dons (Anáfora).
Terminada esta ação de graças
(Eucaristia) todos os presentes exclamam: Amém.
Depois os ministros que
chamamos diáconos distribuem a todos os presentes o pão da Eucaristia e o vinho
misturado com água (Comunhão). Estes mesmos diáconos levam aos ausentes sua
parte do pão e do vinho eucarísticos.
Por fim, os ricos socorrem os
indigentes (Coletas).
A partir do século IV as
alusões à Eucaristia são mais numerosas mas menos precisas por causa da
disciplina do "Arcano" ou segredo, que foi adotada pela Igreja e que
proibia falar da Eucaristia aos não-cristãos.
Nos quatro primeiros
séculos:
Dos numerosos documentos que
temos sobre as celebrações litúrgicas nos quatro primeiros séculos - como, por
exemplo, a Didaqué (ano 90), a Apologia de São Justino (cerca de 150), as
homilias de Orígenes (+254-255), as Constituições Apostólicas (entre 370 e 410)
- pode-se concluir que em todas as Igrejas (Roma, Alexandria, Antioquia e norte
da África) havia grande uniformidade nas linhas gerais, isto é:
Liturgia dos catecúmenos com
leituras, homilia, e oração.
Liturgia dos fiéis com ósculo
da paz, súplicas, anáfora ou ofertório, narração da última ceia, consagração,
anamnese e comunhão.
Esta uniformidade
restringia-se, todavia, às linhas gerais, pois o celebrante tinha grande
liberdade na composição das orações e na ordenação dos pormenores rituais:
desenvolvendo o mesmo tema (Ação de Graças pelos dons recebidos), cada
celebrante o fazia a seu modo, por isso temos fórmulas parecidas no fundo e
diferentes na forma.
Esta liberdade, porém, não
será um obstáculo à unificação progressiva das celebrações: Com efeito, as
cerimônias repetidas freqüentemente tornam-se costumes fixos, ritos mais
imponentes e mais complicados que dificilmente o celebrante poderia modificar.
Quanto às orações, o bispo ou sacerdote devia seguir uma norma geral no
desenvolvimento das idéias; e quem reza pelas mesmas intenções acaba,
forçosamente, repetindo as mesmas palavras; e fórmulas repetidas por muitos
tornam-se tradicionais, especialmente se provenientes de grandes bispos: seus
discípulos ou sucessores as guardarão com respeito e fidelidade.
Outra causa para esta
unificação foi a influência das grandes metrópoles. As Igrejas de Antioquia, de
Alexandria e de Roma empenhavam-se em propagar a fé cristã nas regiões
vizinhas. As novas Igrejas adotavam os usos litúrgicos da Igreja-Mãe que as
fundou. E assim os vários ritos foram conhecidos pelo nome da grande Igreja que
os usava: Rito Antioqueno, Rito Alexandrino, Rito Romano, Rito Bizantino
(relativo a Bizâncio-Constantinopla).
A partir do século V:
No fim do século IV e começo
do século V encontram-se quase definitivamente constituídas 3 famílias
litúrgicas, ou ritos, conhecidas pelos nomes das 3 grandes Igrejas patriarcais,
a saber: o Rito Romano; o Rito Alexandrino e o Rito Antioqueno. O primeiro e
suas ramificações formam o que se convencionou chamar ritos ocidentais e os
dois últimos, ritos orientais.
1. O Rito Ocidental ou Latino teve duas
ramificações principais: o rito romano (em uso em Roma) e o rito galicano (na
Gália). Este último dividiu-se, dando origem ao rito celta (Ilhas Britânicas),
africano do norte, moçárabe e ambrosiano. Atualmente o Rito Latino apresenta
três liturgias: a romana, a mais importante e que inclui vários costumes
particulares de dioceses e ordens religiosas (como, por exemplo, os das
dioceses de Braga, em Portugal, e de Lyon, na França; e os dos Dominicanos, dos
Beneditinos etc.). A moçárabe, em uso nas Catedrais de Toledo e Salamanca, na
Espanha; e o ambrosiano, em uso em Milão e proximidades, na Itália.
2. Ao Rito Alexandrino, pertencem
atualmente o Rito Copta, no Egito; e o Rito Etíope, ou Abissínio, na Etiópia;
usados por católicos e não-católicos.
3. Do Rito Antioqueno, derivam a maioria
dos ritos orientais em uso atualmente: o Siríaco, o Caldaíno, o Armênio, o
Maronita e o Bizantino.
O
Rito Bizantino tira o seu nome
de Bizâncio, cidadezinha situada sobre o Bósforo, aos confins da Europa e da
Ásia (na Antiga Ásia Menor, a atual Turquia). Constantino Magno transformou-a
em cidade grande e lhe deu seu nome: Constantinopla, cidade de Constantino.
Inaugurada em 330, passou a ser a Capital do Império Romano Oriental. Um de
seus grandes e santos bispos foi São João Crisóstomo (398-404), morto no exílio
em 407.
A Liturgia de Antioquia
chegou até ela com as particularidades introduzidas por Cesaréia de Capadócia,
sede episcopal de São Basílio Magno, (+379). Em razão da centralização civil e
religiosa levada a efeito por Constantinopla, e das prerrogativas que lhe
outorgavam os Concílios Ecumênicos de Constantinopla (381) e de Calcedônia
(451, cânon 28) dando-lhe o nome de Nova Roma e o primeiro lugar após esta
última, a cidade imperial tomou a preeminência no Oriente e as inovações, para
serem legítimas, deviam ser aprovadas por ela; o Rito da capital difundiu-se
rapidamente pelas províncias mais longínquas do Oriente Cristão, pela Europa e
pela Ásia. No século XIII os patriarcados melquitas de Alexandria, de
Jerusalém, de Antioquia, abandonaram seu antigo rito para adotar o de Bizâncio.
Em nossos dias seguem este
rito mais de 200 milhões de fiéis entre católicos e ortodoxos, espalhados pelo
mundo inteiro, até nas Américas. "Pode-se afirmar que, hoje, do ponto de
vista da extensão geográfica e do número de fiéis, Rito Bizantino equivale a
Rito Oriental, quase como Rito Romano a Rito Ocidental" (Salaville).
"Conhecer, venerar e
conservar e fomentar o riquíssimo patrimônio litúrgico e espiritual dos
orientais é de máxima importância para guardar fielmente a plenitude da
tradição crista e realizar a reconciliação dos cristãos orientais e ocidentais
(Decreto sobre Ecumenismo, 1_1)
"Longe de obstar a
unidade da Igreja, certa diversidade de costumes e usos ... Antes aumenta-lhe o
decoro e contribui não pouco para cumprir sua missão" (Decreto sobre
Ecumenismo, 16).
Há no Rito Bizantino três
liturgias:
Esta última seria uma
abreviação da de São Basílio. É ela que se celebra quase todos os dias e que
vamos tentar explicar.
A Missa de São João Crisóstomo
A Missa de São João
Crisóstomo divide-se em 3 partes:
A preparação das oferendas ou
da matéria do sacrifício;
A Liturgia dos Catecúmenos ou
Liturgia da Palavra;
A Liturgia dos Fiéis ou
Liturgia Eucarística.
Simbolismo
As cerimônias da Missa são
cheias de simbolismo. E não é de estranhar, pois o próprio Cristo, como vimos,
quis que a Eucaristia seja um memorial da sua paixão, morte e ressurreição. E a
Igreja ordenou a Divina Liturgia de modo a nos lembrar a pessoa do Salvador e
os mistérios da sua vida sobre a terra.
Quanto ao simbolismo,
divide-se a Missa em quatro partes:
A primeira vai da preparação
até a procissão do Santo Evangelho, e simboliza a vida oculta de Cristo.
A segunda parte vai da
procissão do Evangelho até a procissão do ofertório, e simboliza a vida pública
de Cristo.
A terceira parte vai da
procissão do Ofertório até depois da Comunhão, e simboliza a vida padecente de
Cristo (Paixão e morte).
A quarta parte vai de depois
da Comunhão até o fim, e simboliza a vida gloriosa de Cristo.
Celebração de frente para o povo.
Celebração de frente para o povo.
Na Liturgia Romana renovada o
Celebrante é considerado como o Presidente da Assembléia, o anfitrião dos
comensais na mesa do Senhor. Por isso lhe é recomendado (não prescrito)
celebrar de frente para o povo.
Na Liturgia Bizantina o
Celebrante é considerado mais como o guia, o introdutor dos fiéis ao banquete
eucarístico, e seu porta-voz na sua audiência com Deus; como o pastor que
"caminha diante do rebanho" para conduzi-lo às fontes da graça e da
salvação. Ele é Cristo caminhando adiante de seus discípulos, quando subia a
Jerusalém ao encontro de sua paixão e morte (Mc 10,32) que vai renovar
misticamente sobre o Altar. Por isso não se adotou o uso de celebrar de frente
para o povo. A Liturgia não é unicamente Ceia, é também sacrifício.
Freqüentemente, porém, o
celebrante volta-se para a Assembléia para transmitir-lhe os ensinamentos e os
preceitos do Mestre e desejar-lhe a paz. Duas vezes anda no meio dela como
fazia Cristo (procissão do Evangelho e procissão do Ofertório).
Primeira Parte da Missa
Preparação das oferendas ou
Matéria do Sacrifício (Prótese)
Esta primeira parte se faz
secretamente, dentro do santuário, sem a participação dos fiéis, simbolizando
assim os 30 anos de vida oculta que o Salvador passou preparando-se para o seu
ministério público.
Após ter rezado as orações
chamadas "Oração da porta", porque se fazem diante da "porta
santa", que dá acesso ao santuário, e dos ícones do Salvador e da Mãe de
Deus, o sacerdote entra no santuário, paramenta-se, lava as mãos e se dirige
para o altar pequeno, chamado "Altar da Preparação", ou Prótese, e
situado à esquerda do altar-mor. Sobre ele acham-se já colocados os objetos que
vão servir para o sacrifício, a saber: o cálice, a patena, o asterisco, os véus
(grande e pequenos), o pão, a água e o vinho e uma pequena espátula (em forma
de lança).
O pão do sacrifício só pode
ser de farinha de trigo pura e com fermento. Chama-se "prósfora",
isto é, oferenda, oblata , porque eram os fiéis que o ofereciam para o
sacrifício. Antigamente usavam-se 5 pães, mas hoje um só é suficiente. (E até
está-se introduzindo o costume do uso de hóstias pré-cortadas.) De forma
redonda, leva no meio a marca de um selo quadrado com as abreviações das
palavras gregas que significam: "Jesus Cristo triunfa". Esta parte
carimbada formará a hóstia chamada "Cordeiro", para lembrar o cordeiro
pascal, figura de Cristo, o Cordeiro de Deus que veio à terra para tirar o
pecado do mundo.
Com a lança o sacerdote tira
da prósfora o "Cordeiro" que põe no meio da patena; e derrama vinho e
água no cálice. Depois corta uma partícula (geralmente triangular, chamada
"panaghia"), em honra à Virgem Maria, Mãe de Deus; e partículas em
honra dos Santos e em intenção dos vivos e dos mortos; cobre o cálice e a
patena com os véus; incensa as oblatas e recita a oração da oferenda que cada
um dos concelebrantes deve rezar, mesmo se não participou da preparação da
matéria do sacrifício.
Simbolismo da Prótese
A Prótese simboliza a
manjedoura onde nasceu o Salvador. Mas, como ele nasceu para ser vítima, o
sacerdote, representando o Espírito Santo realizando o mistério da Encarnação,
extrai o Cordeiro do pão como do seio virginal da Santíssima Mãe de Deus,
proferindo as palavras do profeta Isaías, que o mostrava vítima de propiciação
para nossos pecados:
"Como uma ovelha foi
levado ao matadouro. E como um cordeiro sem mancha diante do que o tosquia não
abriu sequer a sua boca. Na sua humildade, o seu julgamento foi exaltado. Quem
contará à sua geração? Porque a sua vida é tirada da terra" (Is 3,7s.)
E, entalhando a hóstia em
forma de cruz, diz:
"É imolado o Cordeiro
de Deus que tira o pecado do mundo, para a vida e a salvação do mundo".
Jesus ofereceu-se em oblação
desde o primeiro instante da sua vida terrestre: "Eis que venho para fazer
a tua vontade"; esta oblação teve sua coroação no Calvário.
Nascimento e morte do
Salvador são duas fases de um mesmo ato. Por isso a Liturgia Bizantina
considera também a Prótese como o lugar onde se imola em figura o Cordeiro. O
vinho é misturado com água, porque do lado do Salvador saiu sangue e água. O
sacerdote faz esta mistura depois de abrir com a lança o lado direito do
Cordeiro, em cima da palavra IS., dizendo o versículo de São João:
"E um dos soldados
abriu-lhe o lado com uma lança e imediatamente saiu sangue e água. Aquele que
viu deu testemunho, e seu testemunho é verdadeiro ".
A Mãe de Deus é figurada pela
partícula especial colocada à direita do Cordeiro como se estivesse no
Calvário. Colocando esta partícula, o sacerdote repete o versículo do salmo 44
que diz que o lugar da rainha é à direita do rei:
"A Rainha pôs-se à
vossa direita, envolta num manto bordado a ouro.
À esquerda do Cordeiro são
colocadas em 3 filas, 9 partículas em honra às legiões de santos: os Anjos; São
João Batista, o Precursor; os Profetas; os Apóstolos; os Santos Bispos e Padres
da Igreja; os mártires; os santos ascetas; os anárgiros, São Joaquim e Ana,
avós de Deus; o Padroeiro da Igreja, São João Crisóstomo ou São Basílio,
autores da Liturgia que vai ser celebrada. Por baixo do Cordeiro colocam-se
partículas em memória dos vivos e dos mortos: especialmente daqueles pelos quais
a missa será celebrada.
E assim, acham-se reunidos em
redor do Cordeiro os seus membros místicos que formam a Igreja triunfante no
céu, a Igreja militante na terra e a Igreja padecente no purgatório. Voltando a
ver no altar da pregação a gruta de Belém e, na patena, a manjedoura, o
sacerdote coloca em cima desta um asterisco simbolizando a estrela que guiou os
magos e "parou sobre o lugar onde estava o menino". Depois cobre as
oblatas com os véus para lembrar as faixas com as quais Maria envolveu o corpo
do Menino Jesus recém-nascido na manjedoura; e os lençóis que serviram para
envolver o corpo do Salvador morto após a descida da cruz. Enfim, incensa as
oferendas para lembrar os presentes dos Reis magos e também os aromas com os
quais as santas mulheres (miróforas) embalsamaram o corpo do Redentor.
“O Deus, ó nosso Deus, que
enviastes Nosso Senhor Jesus Cristo, o pão celeste, o alimento do mundo
inteiro, como salvador, Redentor e Benfeitor, para nos abençoar e nos
santificar; abençoai esta oferenda... e lembrai-vos dos que a ofereceram e
daqueles pelos quais foi oferecida e guardai-nos irrepreensíveis no cumprimento
dos vossos divinos mistérios".
Segunda Parte
da Missa
Liturgia dos Catecúmenos ou
Liturgia da Palavra
Esta parte compreende:
Uma longa oração dialogada
chamada Grande súplica (grande sinapti) ou irinica.
Cantos de salmos, antífonas
ou típica, com duas pequenas sinaptes.
A pequena entrada ou
procissão com o livro dos Santos Evangelhos.
Hinos próprios do dia
(tropário).
O Hino do triságion: Santo
Deus...
A Epístola com seu prokímenon
e Aleluia.
O Evangelho.
O ectení ou súplica
insistente.
Oração pelos catecúmenos (e
despedida dos mesmos).
Até a procissão com o
Evangelho esta parte continua simbolizando a vida oculta de Jesus. Da procissão
do Santo Evangelho até a procissão do ofertório, recorda-se a vida pública de
Jesus até sua paixão.
O Incenso
O Sacerdote termina a
preparação das oferendas e começa a Missa dos Catecúmenos, incensando os dois
altares, os ícones, a Igreja e os fiéis. Este é o primeiro grande incensação. O
incenso queimado pelo fogo transforma-se em fumaça que sobe ao céu em forma de
nuvens, enchendo o ambiente da fragrância de seu aroma. Sua destruição pelo
fogo faz dele um holocausto e seu aroma é o fruto desta destruição. Assim os
discípulos de Cristo devem oferecer-se em holocausto a Deus e irradiar em volta
o bom odor espiritual de sua vida cristã. A fumaça do incenso que se eleva para
o alto figura a oração pela qual a alma se eleva a Deus. Por isso ouvimos o Salmista
(140,2) clamar: "Que minha oração, Senhor, suba até vós como o
incenso" e vimos no livro do Apocalipse (5,8) as orações dos Santos no céu
representadas por taças de ouro cheias de perfumes que os 24 anciãos revestidos
de branco, oferecem ao Cordeiro de Deus que está de pé no meio do trono, como
se tivesse sido imolado. Assim, o incenso cria desde o início da Missa uma
atmosfera celeste lembrando ao sacerdote e aos fiéis a necessidade de se
prepararem para o sacrifício, para serem, como diz o Apóstolo, "o bom odor
de Cristo", pelo qual difunde em toda a parte o perfume de sua
doutrina" (2Cor 2,14-15).
Depois de cobrir as oferendas
com os véus, o sacerdote inclina-se 3 vezes diante delas e as incensa, em sinal
de adoração para lembrar a adoração dos reis Magos ao Menino Jesus e os
presentes (ouro, incenso e mirra), que lhe ofereceram. Dirigindo-se em seguida
ao altar-mor, incensa-o nos quatro lados, rezando secretamente: "ó Cristo,
estáveis de corpo no sepulcro e com a alma nos infernos, e, como Deus, no paraíso
com o ladrão; e no trono com o Pai e o Espírito Santo, ocupando todo lugar, vós
o ilimitado".
Com isto recorda:
O lugar simbolizado pelo
altar, isto é, o Gólgota e o sepulcro, onde o Filho de Deus encarnado morreu
para a redenção do gênero humano;
Os infernos (ou Mansão dos
mortos) (aqui no sentido de limbo), onde desceu depois de morto, para salvar os
justos que morreram, antes dele, e estavam à sua espera. Por isso havia
habitualmente túmulos debaixo dos altares:
O Paraíso ou Céu, onde fez
entrar o bom ladrão;
O trono celeste, no qual
sentou-se glorioso, à direita do Pai.
Prosseguindo, incensa os
ícones, a Igreja e os fiéis.
O sacerdote incensa o altar
porque é o trono de Deus; os ícones, porque o representam e representam seus
santos; os fiéis, porque são suas criaturas feitas à sua imagem e semelhança;
os objetos de culto porque consagrados a ele; e a Igreja porque é sua casa.
Incensando os fiéis no início da missa, o Sacerdote lembra um antigo costume na
vida doméstica de todos os povos do Oriente, que ofereciam ao hóspede, desde a
sua entrada em casa, com que se lavar e se perfumar (ver Lc 7,44-47). Assim o
sacerdote, em sua qualidade de ministro de Deus, incensa o rico e o pobre sem
distinção, dando-lhes as boas-vindas a este banquete espiritual, a esta ceia
mística, como hóspedes e visitantes convidados a serem comensais do Rei
celeste.
É bom também observar que,
cada vez que Cristo vai aparecer (ou se manifestar) durante o sacrifício, sua
aparição é precedida pelo incensação: no começo da missa, no evangelho e no
ofertório. Nestes três momentos que lembram a aparição de Cristo (no primeiro,
como recém-nascido; no segundo, como pregando a Boa-Nova; e, no terceiro, como
sofrendo por nossa causa), a Igreja convida-nos a recebê-lo com perfumes, e a
encher nossos corações do aroma dos bons sentimentos de caridade, fé, humildade
e pureza.
"Bendito seja o Reino do
Pai... "
Após ter beijado o Evangelho
e o Altar, o sacerdote segura o livro dos Evangelhos com as duas mãos, faz com
ele uma cruz em cima do Antimênsion, e diz em voz alta:
"Bendito seja o reino
do Pai, do Filho e do Espírito Santo, agora..."
O Evangelho é o Verbo, isto
é, a Palavra de Deus e sua Boa-Nova. Nele os Evangelistas nos transmitem as
verdades da nossa fé reveladas pelo Verbo encarnado. Por isso, liturgicamente,
fica sempre colocado em lugar de honra, em cima do Altar, como num trono. Só
cede este lugar ao Verbo de Deus feito homem, quando este, a partir do
ofertório até após a comunhão, for ali levado para ser imolado. A Igreja,
templo e fiéis, é o reino de Deus, isto é, sua morada e seu povo. Abençoando
simbolicamente, em forma de cruz, o universo pelos quatro pontos cardeais, o
sacerdote pede que este reino de Deus, por meio de sua palavra, seja bendito e
propagado pelo mundo inteiro, para a glória da Trindade Santa. A Assembléia,
apoiando o pedido do sacerdote, clama: Amém, assim seja (Amém, é palavra
aramaica, que significa: assim seja).
"Irinica"
Em seguida, o sacerdote
convida os fiéis a repetir as invocações que a Igreja dirige incansavelmente a
Deus, desde os primeiros tempos da sua existência. Convida-os inicialmente a
rezar em paz: "Em paz oremos ao Senhor"; e a pedir a paz, não
qualquer paz, mas a paz que vem do alto, a paz com Deus, com o próximo e com
sua própria consciência, condição indispensável para que a oração seja
atendida. Por causa desta insistência "na paz", esta primeira oração
dialogada foi chamada irinica (do grego: irini = paz).
Os cristãos devem pedir esta
paz não só para si, mas também para o mundo inteiro. Por paz não se entende
somente a ordem, o sossego, a tranqüilidade e o bem-estar temporais, mas
sobretudo a felicidade sobrenatural proveniente da estabilidade das Santas
Igrejas de Deus e da união de todos na fé e na caridade. A oração se faz especialmente
pelos fiéis presentes no templo, que nele se comportam com fé, devoção e temor
(isto é, respeito) de Deus; pelo pastor e pelo clero da diocese; pelos
governantes e seus auxiliares; pelo exército; por todos os povoados do país
(grandes e pequenos, cidades e aldeias), especialmente pela cidade onde se
celebra o sacrifício; pela salubridade do ar, pela abundância dos frutos da
terra necessários à vida, e por tempos pacíficos; pelos viajantes por mar,
terra e ar; pelos que sofrem e para que todos sejam livres de aflição, perigo e
necessidade.
"Kyrie eleison"
A cada um destes pedidos, a
Assembléia dos fiéis, dominada, dizem "As Constituições Apostólicas"
do século IV, pela voz das crianças, clama Kyrie eleison, Senhor, tende
piedade. Convém aqui ressaltar esta referência às vozes infantis participando,
pela fácil repetição, do Kyrie eleison, ao conjunto da oração comum. Assim,
desde o séc. IV manifesta-se a preocupação pela participação ativa das crianças
no Santo Sacrifício. O próprio São João Crisóstomo insiste, em suas homilias,
sobre esta intervenção das crianças inocentes, colocadas à frente da assembléia
(diz ele), na oração dialogada, para solicitar a misericórdia de Deus por seu
povo (d. Le rôle du diacre, p. 14 e 40). Em vez de ficar conversando ou
brincando durante a Missa, as crianças devem, portanto, prestar atenção e
responder, juntamente com os adultos, aos pedidos feitos pelo sacerdote. Deus
gosta de ouvir sua voz, mesmo desafinada, e se interessa por elas. Não disse
ele aos apóstolos: "Deixai vir a mim as crianças?"
O Kyrie eleison é a oração
que mereceu elogio do próprio Cristo, na parábola do Fariseu e do Publicano.
Não devemos, pois, cansar-nos de repeti-Ia. É o grito do homem humilde, pecador
e necessitado que implora a misericórdia de seu Senhor. E Deus, diz-nos o
Salmista, "atende à oração dos humildes e não despreza a sua prece"
(101,18).
Comemorando...
Para marcar a impotência de
nossas orações, às quais faltam a pureza da consciência, a reta intenção e o
ardor da fé e da esperança, o sacerdote, dirigindo seus olhares para a Mãe de
Deus e os santos, convida os fiéis a comemorar, isto é, a recorrer àqueles que
sabiam rezar melhor do que nós e que, agora, rezam por nós no céu; e a nos
recomendar, nós mesmos, uns e outros e toda a nossa vida a Cristo, nosso Deus.
Ao ouvir aqui o nome de Maria, os fiéis costumam fazer uma inclinação da cabeça
em direção ao Ícone da Mãe de Deus, dirigindo-lhe uma das saudações seguintes:
"A Ela, a mais nobre das saudações" ou "Em ti deposito toda a
minha esperança", ou " Santíssima Mãe de Deus, salva-nos!". Esta
saudação não consta nas rubricas, nem está exigida pelo sentido da oração, é
antes uma jaculatória saindo espontaneamente do coração de filhos profundamente
devotos à sua mãe. Fazem também uma inclinação em direção ao Ícone do Salvador,
quando ouvem o nome de Cristo.
Atendendo ao convite do
sacerdote e, em união com ele, a assembléia clama: a Ti, Senhor, isto é, Sim,
nós nos recomendamos a Ti, Senhor.
O sacerdote termina esta
série de súplicas pela glorificação da Santíssima Trindade, glorificação esta
que, tal um fio de ouro ligando tudo, corre através da Liturgia, começando e
concluindo cada ato e cada oração. Nesta glorificação o sacerdote exprime
também os motivos que nos levam a ter confiança que nossos pedidos serão
atendidos por Deus: Ele é poderoso, glorioso, misericordioso e amigo dos
homens. A Assembléia em oração expressa sua adesão pelo "Amém",
"assim seja".
Antífonas, Típica e Sinaptes
Entre a grande súplica da paz
(grande sinapti ou irinica) e as duas súplicas pequenas (pequenas sinaptes) o
coro ou o povo canta as Antífonas, as típicas e o macarismi (Bem-aventuranças).
Sinapti: A palavra sinapti equivale ao termo latino
"collecta": nela o sacerdote recolhe, colige em uma fórmula comum as
intenções principais de cada um e de todos os membros da Assembléia.
Antigamente a grande sinapti ou irinica era repetida depois da 1 a e da 2a Antífona (e entre
as orações pelos fiéis); depois a Igreja contentou-se com o primeiro e o último
pedido, a comemoração da Mãe de Deus e dos Santos e a glorificação da
Santíssima Trindade, para evitar a repetição cansativa.
Antífonas: São aclamações ou jaculatórias, cantadas pelo coro,
em forma de estribilho e intercaladas entre os versículos de certos salmos,
escolhidos de acordo com a festa que se celebra, e lidos pelo leitor no meio do
coro. Aqui também antigamente lia-se o salmo inteiro; depois, para abreviar,
contentou-se com 3 ou 4 versículos; e, em nossos dias, geralmente cantam-se
somente as antífonas sem os versículos dos salmos.
Nos dias comuns da semana as
antífonas são as mesmas; para as festas do Senhor e da Mãe de Deus, há
antífonas e salmos próprios escolhidos de acordo com cada festa. A aclamação,
porém, da primeira antífona é invariável para os dias comuns como para as
festas: é um apelo à intercessão da Mãe de Deus: pela intercessão da Mãe de
Deus, ó Salvador, salvai-nos.
Típica: Aos domingos, em geral, as duas primeiras antífonas
são substituídas pelos salmos 102 e 145, respectivamente, chamados "típica",
isto é, marcados; e a 3a pelas "bem-aventuranças" do Sermão da
Montanha, conhecidas pela palavra grega que começa cada uma
"Macarismi" "Bem-aventurados". É pena que as típicas e
sobretudo os macarismi estejam sendo postos de lado: serviam tão bem para
lembrar o que alguém chamou de "Carta Magna do Cristianismo", e para
anunciar a aparição do Salvador como pregador da sua nova doutrina, a ser
simbolizada pela pequena entrada: Bem aventurados os pobres, os que choram, os
mansos, os misericordiosos, os puros, os pacíficos, os perseguidos...
O Monogenis (á Filho Unigênito). No
fim da 2a Antífona ou do 2° Salmo das típicas, canta-se o hino: "Ó Filho
Unigênito" (em grego o Monogenis). Este hino, composto provavelmente em
Antioquia (pelo patriarca Sevério) e introduzido na Liturgia pelo imperador
lustiniano 11 em 535 é de grande teor teológico: em poucas palavras, enuncia os
mistérios fundamentais da nossa fé: a Santíssima Trindade, a Encarnação do
Filho de Deus, a Redenção do gênero humano pela morte de Cristo na cruz; a
maternidade divina de Maria e sua virgindade perpétua. Uns liturgistas
consideram-no como uma profissão de fé para os catecúmenos como o Credo para os
fiéis.
A Pequena Entrada
Enquanto o coro canta a 3ª
Antífona ou as Bem-aventuranças, o sacerdote precedido pelo diácono segurando o
Evangelho, e pelos acólitos segurando a cruz, as tochas e o turíbulo, desce do
altar e sai, não pela porta Santa, mas pela porta lateral norte, atravessa em
procissão a Igreja, passando no meio do povo, e entra no santuário pela porta
Santa ou Real. Qual é o sentido desta procissão chamada a procissão do
Evangelho ou "pequena entrada" para distingui-la da entrada do
ofertório? "A entrada do Evangelho, diz São Germano, patriarca de
Constantinopla, simboliza a vinda do Filho de Deus e sua entrada no
mundo." O diácono, segurando o Evangelho, figura o Precursor que devia
mostrar o Filho de Deus ao mundo. "Eis o Cordeiro de Deus que tira o
pecado do mundo", disse João Batista ao ver Jesus aproximar-se dele. O
sacerdote representa Nosso Senhor Jesus Cristo vestindo a nossa natureza humana
e descendo do céu (o santuário) sobre a terra (a nave), no meio dos homens. Os
ceroferários precedem com tochas acesas, porque o Cristo é a luz do mundo
"Eu sou a luz do mundo", e São João Batista foi qualificado pelo
próprio Cristo como "lâmpada ardente e brilhante", da luz da qual os
judeus quiseram gozar apenas por pouco tempo (10 5,35). A cruz que segue lembra
o modo e o instrumento que Cristo escolheu para salvar os homens.
Os fiéis, considerando o
Evangelho, levado pelas mãos de humildes ministros da Igreja, como o próprio
Salvador aparecendo pela primeira vez em público para a sua pregação divina,
ficam de pé e inclinam-se diante dele, porque, como diz São Paulo, "Quando
Deus Pai introduz o seu Primogênito na terra diz: e todos os Anjos de Deus o
adorem" (Hb 1,6).
A procissão pára no meio da
Igreja, a uma pequena distância da porta Santa. O Sacerdote, inclinando a
cabeça, pede secretamente a Deus, que estabeleceu nos céus, legiões e exércitos
de anjos e arcanjos para o serviço da sua glória, que faça com que esses mesmos
exércitos, unidos aos fiéis na glorificação da sua bondade, o acompanhem até o
altar.
Antigamente, nas cerimônias
oficiais profanas, um arauto anunciava a chegada do Imperador, clamando:
"O Imperador!" para que todos os presentes se levantem e o recebam
com respeito. Assim também, o diácono (ou o sacerdote) anuncia a presença do
Verbo de Deus, sabedoria infinita e eterna, representado pelo Evangelho,
clamando: "A Sabedoria!", e convida os fiéis a ficarem de pé por
respeito.
A entrada dos justos no céu
foi obtida pela Santa Cruz: o sacerdote benze as portas santas, em forma de
cruz, e, elevando o Santo Evangelho, faz com ele no ar uma grande Cruz e canta:
"Vinde, adoremos e prostremo-nos ante o Cristo!..." O povo repete a
2a parte do canto da entrada para manifestar que está de acordo com tudo o que
foi dito e feito: - "Salva-nos, ó Filho de Deus..." Entrando no
santuário pelas portas santas, o sacerdote recoloca sobre o altar o evangelho,
que é a palavra da verdade e da vida.
Nota: Na liturgia pontifical, celebrada pelo bispo
diocesano, o bispo se paramenta e permanece até a pequena entrada, sentado num
trono colocado no centro da Igreja no meio do povo, representando Cristo que,
pela encarnação, se fez homem e morreu no meio dos homens que vinha salvar,
ouvindo-os e ensinando-os. Com a procissão do Evangelho, sobe ao altar.
Tropário
Terminada a procissão do
Evangelho, sacerdote e diácono entram no santuário cantando o isodicon (ou
canto de entrada), que o coro repete. Em seguida, cantam-se os tropários ou
hinos do dia.
Os tropários são hinos ou
composições poéticas sobre a festa do Senhor, da Mãe de Deus ou dos santos que
a Igreja comemora naquele dia. Podem ser qualificados como a "pregação
pelo exemplo precedendo a pregação pela Palavra". No domingo, dia do
Senhor, comemora-se o ano todo a Ressurreição de Cristo. Por isso o primeiro
hino a ser cantado é o "apolitikion da Ressurreição", segundo um dos
oito tons litúrgicos, e que recorda este grande acontecimento, base e razão da
nossa fé, visto que, como diz São Paulo aos Corintios: "Se Cristo não
ressuscitou, vã é a nossa pregação, e vã também a vossa fé" (lCor 15,14).
Nas festas do Senhor, da Mãe
de Deus e dos Santos, os tropários enaltecem os mistérios da vida de Jesus e de
sua Mãe, e as virtudes e feitos dos cristãos que seguiram os passos do Salvador
renunciando a tudo neste mundo e sacrificando-se por ele até a morte. E
cantam-se logo depois da entrada do Evangelho, justamente para nos apresentar o
exemplo daqueles que puseram em prática os ensinamentos contidos neste mesmo
Evangelho e assim mereceram entrar no reino dos céus, conforme disse Jesus a
seus discípulos: "Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a todas as criaturas.
Aquele que crer e for batizado será salvo. Aquele que não crer será
condenado" (Mt 16,15-16).
Esses hinos têm nomes
diferentes de acordo com o lugar que ocupam e o assunto que desenvolvem na
composição poética, chamada "Cânon", da qual fazem parte: Tropário,
Apolitikion, kondakion, Hirmos...
As grandes festas do ano são
anunciadas, aos domingos, com várias semanas de antecedência, pelo kondakion
final; e seus tropários continuam a ser cantados durante a oitava que segue a
festa. O kondakion do Padroeiro da Igreja é sempre o penúltimo.
Triságion
"Santo Deus, Santo
Forte, Santo Imortal, tem piedade de nós."
Existe uma lenda relativa à
origem deste hino do triságion (três vezes santo) e a sua introdução na
liturgia. É a seguinte: No século V, no tempo do Patriarca São Prodo, sucessor
de São João Crisóstomo, a cidade de Constantinopla foi abalada por terremotos
durante quatro meses. Um dia, enquanto o povo, dominado pelo medo, implorava
fora das muralhas a misericórdia divina, gritando Kyrie eleison (Senhor, tem
piedade), um menino foi arrebatado aos céus e lá ouviu os anjos cantarem o
triságion, diante do trono de Deus, e uma voz ordenando ao bispo que
organizasse procissões nas quais se cantaria esse hino. Voltando à terra, o
menino contou o que viu e ouviu. O patriarca mandou fazer de acordo com a ordem
recebida, e o terremoto parou. Este hino se reza também no início e no fim de
todos os ofícios públicos.
A Igreja bizantina sempre
considerou este hino dirigido à Santíssima Trindade, cada uma das partes
referindo-se a uma das 3 pessoas divinas:
Santo Deus, Pai eterno
Santo Forte, seu Filho, que é
sua força e seu verbo criador.
Santo Imortal, seu Espírito
Santo, isto é, o amor que não morre, e sua vontade sempre viva e vivificante.
Para comprovar esta
atribuição temos o fato seguinte: Em 470, um patriarca de Antioquia (Pedro, o
Pisoeiro) acrescentou após "Santo Imortal", que foi crucificado por
nós. Este acréscimo provocou grandes discussões teológicas e acabou sendo
proibido, com o seguinte argumento: Santo Imortal refere-se ao Espírito Santo;
ora, quem foi crucificado por nós foi o Filho: portanto, este acréscimo não se
pode fazer depois da terceira parte.
Esta atribuição é claramente
expressa no hino seguinte:
"Vinde, povo,
adoremos a Divindade em três pessoas:
o Pai no Filho com o Espírito Santo.
Porque o Pai, de toda eternidade
gera um Verbo co-eterno e coreinante
e o Espírito Santo está no Pai,
glorificado com o Filho, poder único,
única essência, única divindade;
é ela que adoramos quando dizemos:
Santo Deus,
que criou tudo pelo Filho
com a colaboração do Espírito Santo;
Santo Poderoso,
por quem conhecemos o Pai
e por quem o Espírito Santo veio ao mundo;
Santo Imortal, Espírito
Consolador que procede do Pai e repousa no Filho:
Trindade Santa, glória a Ti".
adoremos a Divindade em três pessoas:
o Pai no Filho com o Espírito Santo.
Porque o Pai, de toda eternidade
gera um Verbo co-eterno e coreinante
e o Espírito Santo está no Pai,
glorificado com o Filho, poder único,
única essência, única divindade;
é ela que adoramos quando dizemos:
Santo Deus,
que criou tudo pelo Filho
com a colaboração do Espírito Santo;
Santo Poderoso,
por quem conhecemos o Pai
e por quem o Espírito Santo veio ao mundo;
Santo Imortal, Espírito
Consolador que procede do Pai e repousa no Filho:
Trindade Santa, glória a Ti".
Pentecostes, Grandes vésperas
Pelo mesmo motivo ele se
canta três vezes seguidas; e nas Missas Pontificais solenes, cinco vezes: as
três primeiras vezes em louvor ao mistério da Santíssima Trindade; e as duas
outras em honra do mistério da Encarnação, isto é, a existência de duas
naturezas em Cristo.
Vamos dar mais detalhes sobre
o canto do triságion nas Missas Pontificais do triságion: nas Missas
Pontificais usam-se o dikírion e o trikírion, que são dois castiçais pequenos,
suportando um (o dikírion) duas velas cruzadas; outro (o trikírion) três velas
cruzadas. O primeiro simboliza a encarnação, isto é, (duas naturezas e uma
pessoa em Cristo); o segundo, a Santíssima Trindade = uma só natureza divina em
três pessoas distintas.
Na hora do triságion o bispo
dá uma bênção solene com o dikírion e o trikírion, da seguinte maneira:
Pela terceira e quinta vez o
triságion é cantado pelos sacerdotes, no santuário, enquanto o Bispo faz uma
cruz em cima do altar com o trikírion (quando do 3° triságion) e com o dikírion
(quando do 5°). Em seguida, de frente para o povo, segurando com a mão direita
o trikírion e com a esquerda o dikírion, o Bispo ouve o coro cantar a primeira
parte do triságion, isto é, "Santo Deus", e dá a bênção aos fiéis que
estão no centro da igreja, dizendo: "Senhor, Senhor, olhai do alto do céu
e cuidai desta vinha e fazei-a crescer porque foi vossa mão direita que a
plantou". Depois do canto da segunda parte, "Santo Poderoso", dá
a bênção aos fiéis do lado direito com a mesma fórmula; e faz o mesmo para o
lado esquerdo, após o canto da terceira parte: "Santo Imortal". Cada
vez o bispo pode usar uma língua diferente: por exemplo, grego, latim e
vernáculo.
Substituição do
"triságion"
1. Nos dias em que na
Antigüidade se administrava o Batismo com solenidade, o triságion é substituído
pelo versículo seguinte tirado de São Paulo e dirigido àqueles que foram
batizados: "Vós todos que fostes batizados no Cristo, vos revestistes do
Cristo. Aleluia". Estes dias são o dia do Natal, da Epifania, Sábado de
Lázaro (antes do Domingo de Ramos), Vigília Pascal (noite de sábado santo para
domingo de Páscoa), a Semana da Páscoa, e o dia de Pentecostes.
2. Nos dias em que se venera
a Santa Cruz, substitui o triságion a aclamação seguinte: "Adoramos vossa
Cruz, Senhor, e glorificamos vossa santa Ressurreição. Aleluia". Estes
dias são: 30º domingo da quaresma, 10º dia de agosto, 14 de setembro (Exaltação
da Santa Cruz).
Epístola e Evangelho
Terminado o canto do
triságion, faz-se a leitura da Epístola e do Evangelho. A Epístola é lida pelo
leitor e o Evangelho pelo diácono ou pelo sacerdote. Na Missa há somente
leituras tiradas do Novo Testamento. As do Antigo Testamento se fazem nos
outros ofícios litúrgicos, sobretudo no Ofício de Vésperas.
Os
Evangelistas na Arte Cristã
Desde a origem e talvez
enquanto ainda viviam os Apóstolos, considerava-se o número de quatro
Evangelhos como um fato providencial, para o qual procuravam uma razão mística.
A explicação mais comum que se dava no tempo de Santo Irineu ( + 202 ou 203)
era o paralelo com os querubins alados do Profeta Ezequiel: No primeiro
capítulo de sua profecia, Ezequiel descreve a visão que teve e na qual viu
quatro seres que aparentavam possuir, cada um, num só corpo, a figura de um homem,
de um leão, de um touro (boi) e de uma águia. De cada uma destas figuras, os
Santos Padres fizeram o emblema de um evangelista, atribuindo o homem a São
Mateus, o leão a São Marcos, o touro a São Lucas, e a águia a São João.
São Jerônimo explica esta atribuição
do seguinte modo: São Mateus é representado por uma figura de homem, porque
começou seu Evangelho dando a genealogia humana de Jesus, demonstrando assim
que Cristo é homem.
São Marcos é representado
pela figura do leão porque começou seu Evangelho pela enérgica pregação de João
Batista, "voz que clama no deserto", semelhante ao rugido de leão.
São Lucas é figurado pelo
touro porque começou seu Evangelho contando a participação do sacerdote
Zacarias nas cerimônias do culto no templo onde o boi era a vítima usada nos
sacrifícios da Antiga Lei.
São João é simbolizado pela
águia porque iniciou seu Evangelho pela eterna origem de Cristo "no começo
era o Verbo" e por causa das alturas espirituais e divinas a que se
elevou.
A mesa do altar nas igrejas bizantinas
tem como suporte quatro colunas nos quatro cantos, e uma coluna maior no
centro. As quatro colunas laterais simbolizam os quatro Evangelistas; e a do
centro (chamada Cálamos = caniço), a pena com que escreveram (ou melhor, Jesus
Cristo, pedra angular da Igreja).
Homilia
Os fiéis ouvem a leitura do
Evangelho de pé, com atenção e respeito, como fariam discípulos dedicados
ouvindo os ensinamentos de seu mestre e servos fiéis recebendo as ordens de seu
Senhor e chefe e dispostos a executá-las. Terminada a leitura, o povo, movido
pelo sentimento de gratidão por ter sido julgado digno de ouvir a palavra de
vida, clama: "Glória a Ti, Senhor, glória a vós". O sacerdote
recoloca o Evangelho sobre o Altar e faz a homilia ou prática. [...] A homilia
é uma parte integrante da Missa. O sacerdote tem por missão e obrigação pregar
a Palavra de Deus. "Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a todas as
criaturas", disse Jesus a seus Apóstolos (Mc 16,15). E São Paulo recomenda
a Timóteo, seu discípulo predileto (2Tm 4,1-3): "Diante de Deus e de Jesus
Cristo... eu te peço: prega a palavra, insta oportuna e inoportunamente,
repreende, roga, exorta com toda a paciência e doutrina". Se uma das
missões do sacerdote é pregar a Palavra de Deus, a obrigação dos fiéis é ouvi-la
para fazer dela a regra de sua vida: "Quem vos ouve a mim ouve, e quem vos
despreza a mim despreza. E, quem me despreza, despreza aquele que me
enviou" (Lc 10,16).
Nem todos os pregadores têm o
dom da eloqüência. Não é também a beleza do discurso o que mais importa, mas a
verdade; não é a eloqüência e a retórica que se devem procurar antes de tudo,
mas a doutrina. "Quando fui ter convosco", escreveu São Paulo aos
Corintios (1 Cor 2,1), "para vos dar testemunho de Cristo, não fui com a
sublimidade da eloqüência ou da sabedoria... Meu ensino e minha pregação não se
baseavam nas palavras persuasivas da sabedoria humana, mas na manifestação do
Espírito e do poder (de Deus), para que vossa fé não se funda na sabedoria dos
homens, mas no poder de Deus". "Os pregadores plantam e regam, mas só
Deus faz crescer" (1Cor 3,6).
Ectenia ou Súplica Insistente
Depois da homilia o sacerdote
proclama, de novo, as intenções pelas quais a assembléia é convidada a rezar:
"Digamos todos de toda nossa alma e de; todo nosso espírito,
digamos:Senhor tem piedade (Kyrie eleison)". O Kyrie eleison da assembléia
completa a frase iniciada pelo sacerdote, e repete-se três vezes após cada um
dos pedidos feitos pelo celebrante. Esta repetição do tríplice Kyrie eleison,
assim como a intensidade progressiva das súplicas, e também certa liberdade
deixada ao presidente da assembléia para acrescentar pedidos à vontade, de
acordo com as necessidades do momento e dos fiéis, levou a dar a esta série de
pedidos o nome de "ectenia" que quer dizer "súplica
insistente". Alguns lhe deram a qualificação de "Católica", no
sentido de oração coletiva universal. A ela corresponde a oração comum ou dos
fiéis ou "prece da comunidade" [ ... ]: os pedidos que a compõem
abrangem todas as classes da sociedade, pois nela se pede:
Pelos chefes hierárquicos
responsáveis diante de Deus pelo bem espiritual da comunidade: bispo,
sacerdotes, diáconos e religiosos.
Pelos membros da comunidade
presentes na Igreja ou residentes na cidade, implorando para eles as graças espirituais
e temporais úteis à sua salvação.
Pelos fiéis (pais e irmãos)
mortos, não somente da paróquia ou da cidade, mas também de todo o universo.
Pelos fundadores da igreja
onde se celebra o Santo Sacrifício. Assim, todos aqueles que contribuíram, de
um modo ou de outro, para a construção da casa de Deus, serão para sempre
lembrados em cada Missa
que nela se celebrar.
Pelos benfeitores do templo
santo, que lhe ofertam o que é necessário à sua manutenção e conservação e ao
serviço divino: pão, vinho, óleo, velas, incenso, toalhas para o altar, vasos
sagrados como cálice e patena, castiçais etc.
Em certas igrejas
acrescenta-se a esta ectenia comum a ectenia dos defuntos, quando a Missa se
celebra por um morto (cf. Le rôle du diGere, p. 62). Após a ectenia universal,
fazem-se orações dialogadas e secretas pelos catecúmenos. Para bem entender a
razão destas orações que parecem anacrônicas, convém recordar uns fatos
históricos. Na Igreja primitiva havia duas leis ou disciplinas que
desapareceram no decorrer dos séculos: a Lei do Arcano ou segredo e a
disciplina do catecumenato.
A Lei do "Arcano"
A Lei do Arcano, que a Igreja
estabeleceu por medida de prudência no tempo das perseguições, proibia revelar
os mistérios da religião cristã àqueles que não tinham ainda sido admitidos em
seu seio pelo batismo. Além do símbolo da fé, a Lei do Arcano abrangia também
os sacramentos e particularmente o sacramento da Eucaristia. Numerosos símbolos
cristãos, como o peixe, a âncora, a barca, o Cordeiro etc... são vestígios e
testemunhos dessa lei. Podemos considerar também como reminiscência do Arcano a
oração preparatória à comunhão, na qual dizemos: "Recebei-me, hoje,
participante da vossa ceia mística, ó Filho de Deus, porque não revelarei vosso
mistério aos vossos inimigos..."
Disciplina do Catecumenato
Na origem bastava fazer
profissão de fé em Cristo para ser logo batizado; a instrução se dava depois.
Mais tarde, no tempo das perseguições, a Igreja teve de proceder com mais
cautela para admitir novos membros em seu seio, exigindo deles um período mais
longo de preparação e de prova; este período chamava-se catecumenato. Durante o
catecumenato, os que se preparavam para entrar na Igreja pelo batismo podiam
assistir somente à primeira parte da missa, chamada por isso "missa dos
catecúmenos", isto é, dos que estavam ainda sendo catequizados.
Havia também várias classes
de catecúmenos. A primeira delas eram os audientes, que deviam sair logo após a
pregação; e a última, os competentes ou eleitos (em grego: fotizomeni), que já
estavam para receber, em breve, o Batismo. Trinta ou quarenta dias antes da
recepção do batismo, os competentes preparavam-se mais intensamente pela
penitência, pela confissão de seus pecados e por uma instrução especial sobre
os mistérios da fé. O catecumenato durava dois ou três anos, às vezes mais. O
batismo era administrado nas vigílias da Páscoa e de Pentecostes; e, no
Oriente, também na Epifania. A confirmação e a comunhão eram conferidas logo
após o batismo. Até hoje, no rito bizantino, o sacerdote administra a
confirmação juntamente com o batismo, e pode dar a comunhão até às crianças sob
a espécie do vinho.
Na missa, pois, depois da
homilia, faziam-se orações pelos catecúmenos e pelas várias categorias de
pessoas que deviam abandonar o recinto da celebração eucarística, como os
penitentes e os energúmenos (possessos). E em seguida eram despedidos por
intermédio dos diáconos que clamavam: "Saiam todos os catecúmenos;
catecúmenos, saí; saiam todos os catecúmenos; nenhum dos catecúmenos fique!"
Esta disciplina do
catecumenato desapareceu. No século VII, São Máximo, o Confessor, revela-nos
que, já em seu tempo, a despedida dos catecúmenos e dos fiéis indignos fazia-se
como mera formalidade. E em nosso tempo não se exclui mais ninguém da
assistência à missa toda. As orações pelos catecúmenos, porém, foram
conservadas, ainda que, em
nossa Igreja , não há mais catecúmenos no sentido próprio.
Qual o motivo?
A Igreja reza pelas
necessidades de todos os homens, e também pelas suas próprias necessidades em todos
os países e continentes, e não somente em alguma região determinada. Ora, os
catecúmenos (adultos preparando-se para o batismo) são numerosos nos países de
missão (África e Ásia) e sua fé está em perigo, ameaçada pelas novas ideologias
anticristãs e atéias que procuram conquistá-los. Há também os catecúmenos no
sentido mais amplo: os não-cristãos, os incrédulos, os materialistas e os
pagãos espalhados pelo mundo inteiro e, talvez, vizinhos nossos, que esperam
ainda de nós a palavra de verdade e o banho da regeneração. Oremos, pois, por
eles, "para que o Senhor lhes revele o Evangelho da justiça e os una a sua
Igreja Santa Católica e Apostólica".
Quanto aos próprios fiéis,
eis o que Gogollhes sugere para poderem tirar proveito destas orações:
"Cada um dos fiéis,
entrando em si e vendo quão longe está ainda em relação à fé e às boas obras
daqueles cristãos que, nos primeiros séculos do Cristianismo eram admitidos a
participar da ceia de amor; e como, para assim dizer, contenta-se em se
declarar seguidor de Cristo, sem associá-lo ainda a sua própria vida; como só
ouve e até compreende o sentido dos ensinamentos do Mestre mas não os vive;
quão fria e superficial está ainda a sua fé; como não nutre para com seu irmão
o fogo do divino amor que perdoa tudo e faz derreter a dureza de seu coração;
cada fiel, vendo em si tudo isto, considera-se humildemente ainda catecúmeno. E
quando ouve o sacerdote dizer aos fiéis: "Fiéis, oremos pelos catecúmenos,
convencidos de ser tão pouco dignos do nome de fiel", ao rezar pelos
catecúmenos, reza por si mesmo. E quando ouve o sacerdote dizer:
"Catecúmenos, saí!" treme em seu íntimo e pede ao Salvador que um dia
expulsou do templo os vendedores inescrupulosos, que de casa de orações o
haviam transformado em covil de ladrões, que lhe ilumine a inteligência e lhe
dê coragem para expulsar, ele também, do templo de sua alma, o homem carnal que
o faz indigno de participar de seu sacrifício imaculado, e de conceder-lhe
pureza de coração, humildade, mansidão e fidelidade para que mereça ser
incluído no rebanho dos eleitos e dos verdadeiros fiéis" (N. Gogol).
Durante as orações pelos
catecúmenos, o sacerdote faz com o Evangelho uma cruz em cima do Antimênsion e,
ao pedir a Deus que "lhes revele o Evangelho da justiça", eleva-o e
coloca-o de lado. Assim, o lugar do Verbo de Deus escrito fica livre para
receber o Verbo de Deus vivo, prestes a ser levado para ali ser sacrificado. Em
seguida, abre o Antimênsion no qual geralmente são desenhados os instrumentos
da paixão e a descida da cruz com a Virgem Maria segurando o corpo de Jesus.
Terceira
Parte da Missa
Liturgia dos Fiéis ou Liturgia
Eucarística
E logo começa a Liturgia dos
Fiéis, com o sacerdote dizendo: "Nós todos, fiéis, ainda e novamente em
paz, oremos ao Senhor".
Após a despedida dos
catecúmenos e dos penitentes, os fiéis devem dar graças a Deus por terem sido
considerados dignos de permanecer na Casa de Deus para participar de seus
santos mistérios e, como o publicano, repetir humildemente: "Senhor, tende
piedade de mim que sou pecador".
A Liturgia dos Fiéis
compreende o Ofertório, a Anáfora ou Cânon e a Comunhão.
Ofertório
Orações pelos fiéis
Canto dos querubins
Procissão da Grande Entrada
Segunda oferenda do Pão e do
Vinho no altar
Ecténia pequena
Eticis
Ósculo da paz
Credo
O ponto culminante do
ofertório é o que se chama de "Grande Entrada", que é também um dos
momentos mais solenes da missa. O Sacerdote, numa bela oração secreta, pede
humildemente a Deus a graça de desempenhar, sem incorrer em condenação, o ministério
a ele confiado, visto que: "Nenhum dos que são escravos dos desejos e dos
prazeres da carne é digno de comparecer diante de vós, de aproximar-se de vós e
de vos servir, ó Rei da Glória, porque o vosso serviço é grande e temível,
mesmo às potências celestes".
Depois, a fim de preparar um
ambiente digno e agradável para o Rei de todas as coisas, incensa com profusão
o altar, o santuário, e toda a Igreja, enchendo-a de aroma em forma de densas
nuvens, no meio das quais serão transladados, da prótese até o altar, o pão e o
vinho destinados a se tomarem Corpo e Sangue de Cristo. Lembra também aos fiéis
que suas orações devem subir até Deus como o incenso e que para serem, segundo
a recomendação do Apóstolo, o bom odor de Cristo, terão de se tornar tão puros
quanto os Querubins.
Durante a incensação o
sacerdote reza, de coração contrito, o Salmo 50 e hinos penitenciais, e o coro
canta grave e solenemente o magnífico Hino dito dos Querubins: "Nós que,
misticamente, representamos os Querubins, e cantamos o hino três vezes santo à
Trindade vivificadora, ponhamos de lado toda preocupação temporal para que
possamos acolher o Rei do universo, que as legiões dos anjos acompanham
invisivelmente. Aleluia, Aleluia, Aleluia".
Este hino resume todo o
significado da Grande Entrada: Cortejo de Cristo, Rei, Sacerdote, e Vítima.
Enquanto isso, o sacerdote dirige-se ao Altar da preparação, toma o cálice e a
patena e, precedido pelos acólitos segurando as tochas, a cruz e o turíbulo,
passa em procissão no meio do povo através da nave central, repetindo várias
vezes: "Que o Senhor Deus se lembre de nós todos em seu reino..."
Simbolismo da Grande Entrada
Os liturgistas deram várias
explicações para o valor simbólico desta procissão. São Germano de
Constantinopla diz que lembra o cortejo triunfal que conduziu Jesus de Betânia
a Jerusalém, no domingo de Ramos, enquanto os filhos de Israel clamavam
"Hosana!" e os Querubins no céu cantavam o hino três vezes santo.
Outros vêem nele o Salvador carregando a sua cruz e dirigindo-se ao Calvário
para ali morrer por nós. Para outros, ela simboliza o sepultamento de Cristo,
isto é, José de Arimatéia e Nicodemos transportando o Corpo do Calvário para o
sepulcro. É este simbolismo que sugerem as orações secretas rezadas no altar,
quando nele estão depositados o pão e o vinho. "O nobre José desceu do
madeiro o vosso corpo imaculado, envolveu-o num lençol puro, cobriu-o de aromas
e o depositou com cuidado num túmulo novo." A prótese seria o Calvário e o
altar, o sepulcro no qual "o nobre José depositou o corpo imaculado".
Os fiéis, em sinal de
veneração e respeito, fazem uma inclinação da cabeça e se benzem, quando o
cortejo passa perto deles. Não é raro ouvi-los pedir humildemente em voz baixa:
"Lembrai-vos de mim, Senhor, em vosso reino". O sacerdote, transmitindo
seu pedido a Deus, diz: "Que o Senhor Deus se lembre de nós todos em seu
reino"... Essas manifestações de veneração dirigem-se a Cristo; não ainda
a Cristo presente sob as espécies do pão e do vinho, pois estes não foram ainda
consagrados, mas a Cristo representado já por estas oferendas, destinadas a se
transformar em breve em seu corpo e em seu sangue.
Simeão de Tessalônica diz:
Essas honras tributadas às oblatas que vão se tornar Corpo e Sangue de Cristo
são iguais às honras que se tributam ao príncipe que vai ser coroado rei: era
conduzido com pompa para o lugar da coroação, cercado pelos grandes do reino e
ovacionado pelo povo.
O hino de Cheruvikon foi
composto por um imperador de Bizâncio (Justino II, sobrinho de Justiniano) que,
apesar do poder terreno que detinha, prostrou-se diante do Rei dos céus. E
antigamente em Constantinopla, o próprio imperador, para maior solenidade,
tomava parte na procissão. No começo do Cheruvikon, o primeiro diácono ia
buscar o imperador, que o acompanhava até a prótese: lá o soberano vestia, em
cima dos trajes imperiais, um rico manto de ouro incrustado de pedras
preciosas. Segurando na mão direita uma cruz e, na esquerda, o cetro, andava na
frente da procissão, rodeado pelos membros do governo imperial. Diante das
portas santas, o patriarca e o imperador saudavam-se mutuamente, com uma
inclinação de cabeça. O diácono incensava o Imperador, inclinando-se diante
dele e dizendo: "Que o Senhor Deus se lembre da tua dignidade imperial em
seu reino..." Fazia o mesmo para o Patriarca. O Patriarca, em seguida,
tirava o manto que o imperador havia vestido para a procissão, entregando-o a
um dos diáconos. O imperador voltava a seu lugar e a missa prosseguia.
Em certas circunstâncias o
sacerdote nas portas santas, de frente para o povo, faz menção especial das
intenções pelas quais vai oferecer o santo sacrifício. O coro diz
"amém", e termina o canto do Cherubin, interrompido pela procissão:
"Que as legiões dos anjos acompanhem invisivelmente. Aleluia, Aleluia,
Aleluia". Para ter idéia da solenidade realmente impressionante que é a
Grande Entrada, é preciso ter visto esta cerimônia...
No rito bizantino, mais do
que em qualquer outra tradição, a impressão, o impacto estético deste
cerimonial imponente, é de uma importância fundamental. Segundo a narração da
antiga "Crônica de Nestor", este elemento foi o fator primordial na
conversão da Rússia. Os emissários de Vladimiro, quando voltaram de
Constantinopla, contaram: "Os gregos conduziram-nos para onde tributam o
culto a seu Deus. E não sabíamos mais se estávamos no céu ou na terra. Porque
não há sobre a terra semelhante espetáculo, nem semelhante beleza; e somos
incapazes de explicá-la. Sabemos somente que é ali que Deus habita com os
homens, e não podemos esquecer esta beleza. Qualquer homem que provou algo doce
não suporta mais a amargura. Assim não podemos ficar aqui" (cf. POC T 22,
j. 3-4, 1972, p. 247, nota 15).
Éticis
Terminada a Grande Entrada, o
sacerdote prossegue o diálogo de orações com os fiéis, interrompido pela procissão
das oblatas, dizendo: "Completemos nossa oração ao Senhor". E faz uma
série de pedidos, o primeiro dos quais "pelos preciosos dons que foram
oferecidos".
Enquanto no início da missa
pelas "Irinica", e após o evangelho pela "ectenia" rezou-se
por várias classes de pessoas enumeradas separadamente: bispo, clero,
governantes, habitantes da cidade, viajantes, doentes, fundadores da igreja e
seus benfeitores, cantores, vivos e mortos etc..., nesta série de pedidos
chamada "éticis", rogam-se a Deus graças úteis a todos e a cada um
dos presentes no templo: um dia pacífico e santo; um anjo de paz que nos
acompanhe durante o dia e nos guie no caminho da salvação; o perdão de nossos
pecados; a paz para todos os homens; a paz e o espírito de penitência nos dias
que nos restam para viver; uma morte cristã, sem dor nem remorso de
consciência; e, depois da morte, uma sentença favorável no tribunal de Cristo,
supremo Juiz. E, como sempre, conclui-se pela bela fórmula de recomendação à
Virgem Maria, Mãe de Deus, aos Santos e às orações mútuas dos fiéis, isto é,
pela oportuna recordação das garantias sobrenaturais, provenientes do dogma da
Comunhão dos Santos.
Na oração secreta
correspondente à segunda da oferenda, o celebrante pede a Deus para
"torná-lo apto a oferecer-lhe dons e sacrifícios espirituais pelos seus
próprios pecados e pelos erros do povo".
Ósculo da Paz
O ponto central da sinaxe
eucarística está se aproximando. O sacerdote procura levar os fiéis a uma
preparação mais imediata e mais profunda para este ato sublime, principal
motivo da sua presença no templo. A isto visam suas proclamações e exortações
sucessivas, anunciando o ósculo da paz com o sentido de concórdia e de
caridade; o credo, manifestações públicas da fé; e o início da Anáfora,
exigindo respeito e recolhimento.
O Divino Mestre, no decorrer
da última ceia, disse a seus discípulos: "Eu vos deixo a paz, eu vos dou a
minha paz". O sacerdote, em nome deste mesmo Mestre, saúda os fiéis,
desejando-lhes esta paz do Senhor: "Paz a todos". Os fiéis retribuem
a saudação: "E a teu espírito".
Na última ceia Jesus deu
também a seus discípulos um mandamento novo: "Eu vos dou um novo
mandamento: que vos ameis uns aos outros; assim como eu vos amei, vós vos
deveis amar uns aos outros. Por este sinal todos conhecerão que sois meus
discípulos: se vos amardes uns aos outros" (Jo 13,34). Por isso, como se
faz desde o tempo dos primeiros cristãos, o sacerdote exorta os fiéis a se
amarem mutuamente: "amemo-nos uns aos outros para que confessemos em unidade
de espírito"... A Assembléia completa a frase começada pelo celebrante,
dizendo: "O Pai, o Filho e o Espírito Santo, Trindade consubstancial e
indivisível". Esta conclusão da frase iniciada pelo sacerdote mostra
claramente o acordo e a intimidade do diálogo de orações que devem existir
entre a Assembléia e seu Presidente.
O sacerdote faz três
inclinações diante do altar, dizendo cada vez em voz baixa: "Amar-te-ei,
Senhor, Tu que és a minha força...", beija a patena e o cálice por cima do
véu que os cobre, e também o altar. Os concelebrantes fazem o mesmo, beijando o
altar, e todos se dão mutuamente o ósculo da paz. O ósculo da paz na celebração
litúrgica é muito antigo. No Oriente sempre foi colocado antes da Anáfora, como
preparação para a consagração; no Ocidente transferiram-se para antes da
comunhão.
No documento "Tradição
Apostólica”, de Hipólito de Roma (3° século), lemos: "Os catecúmenos não
devem dar o ósculo da paz, porque o seu ósculo ainda não é santo". Era,
portanto, um gesto reservado aos fiéis; depois de os catecúmenos terem sido
despedidos, os fiéis saudavam-se mutuamente. "Os fiéis dêem-se o ósculo,
prossegue Hipólito, os homens aos homens e as mulheres às mulheres."
Quando os fiéis se tomaram mais numerosos e menos coerentes, para evitar abusos,
o ósculo da paz restringiu-se primeiro aos comungantes e depois aos
celebrantes. Atualmente, no rito bizantino, somente nas missas pontificais, o
bispo, os sacerdotes concelebrantes e os diáconos, se dão o ósculo da paz do
seguinte modo: cada celebrante beija o altar e depois o ombro direito do bispo,
dizendo: "Cristo está no meio de nós". O bispo responde: "Está e
estará". E fazem o mesmo entre si. "Cristo está no meio de nós"
é uma referência às palavras de Jesus: "Onde dois ou três estão reunidos
em meu nome, aí estou no meio deles" (Mt 18,20).
A caridade fraterna é
indispensável para poder presenciar a realização dos santos mistérios e neles
participar; se esta caridade, este amor mútuo, estiver ferido pelo
desentendimento, ou pelo rancor ou ódio, devemos o quanto antes restabelecê-lo
pela reconciliação. Senão não lucraremos nada do sacrifício de Cristo, que em
vão morrerá de novo por nós. Deus não aceitará nossa oferta: "Se estás
diante do altar para entregar a tua oferta e aí te recordares que teu irmão tem
algum motivo de queixa contra ti, deixa tua oferta ali diante do altar; vai
reconciliar-te primeiro com teu irmão e depois voltarás para entregar tua
oferta" (Mt 5,23-24). Baseado neste preceito do Senhor, disse o Apóstolo
que Jesus amava: "Se alguém disser: eu amo a Deus, e odiar seu irmão, é um
mentiroso. Pois quem não ama seu irmão a quem vê, como pode amar a Deus a quem
não vê?" (l Jo 4,20).
Nunca é demais recordar as
exigências da nova lei a esse respeito. Ouçamos como São Paulo canta a caridade
que chama "o caminho mais excelente" (1 Cor 13,1-7): "Se eu
falasse a língua dos homens e dos anjos, e não tivesse a caridade, seria como o
metal que soa ou o címbalo que tine. E se tivesse o dom da profecia e
conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e se tivesse toda a fé, a ponto
de transportar montanhas , se não tivesse a caridade, nada seria. E se
distribuísse todos os meus bens para sustento dos pobres, entregasse o meu
corpo para ser queimado, mas não tivesse a caridade, de nada me aproveitaria. A
caridade é paciente, é benigna; a caridade não é invejosa, não age
inconveniente, não se ensoberbece, não é ambiciosa, não busca os seus
interesses, não se irrita, não pensa mal, não se regozija com a iniqüidade, mas
se regozija com a verdade; tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.
A caridade nunca terá fim".
No rito armênio o significado
do ósculo da paz é ainda mais explícito. O diácono diz: "Saudai-vos
mutuamente pelo ósculo da paz, e que aqueles que não são aptos a participar
destes santos mistérios se retirem e vão rezar fora". Todo o povo se saúda
dizendo: "Jesus Cristo está entre nós". O coro canta um hino muito
breve, mas que sintetiza admiravelmente o sentido infinitamente rico da ação
que se passa neste momento: "A Igreja tornou-se um só corpo, e nosso
ósculo é o penhor desta união; a inimizade foi afastada e a caridade penetrou
em toda parte" (cf. P. Evdokimov, La priere de L'Eg!ise d'Orient, p. 178).
"As portas! As portas! Com
sabedoria fiquemos atentos!"
Esta exclamação dirigia-se outrora
aos porteiros encarregados de guardar as portas da igreja para que nela não
entrassem os que não podiam assistir à missa dos fiéis. A Antigüidade cristã
sentiu a necessidade de um serviço de porteiros, encarregados de acolher e
indicar o lugar aos fiéis, de afastar aqueles que não têm direito a tomar parte
da liturgia, de obter a boa ordem na assembléia, sobretudo no momento da
Comunhão eucarística. Este serviço foi, por vezes, confiado a diáconos (ou
subdiáconos); Roma contudo teve, durante vários séculos, clérigos com a ordem
menor de porteiro. Estas funções, porém, foram depois deixadas aos leigos. Hoje
estas palavras dirigem-se a todos os presentes no templo, advertindo-os para
que vigiem as portas de seu coração, para dentro do qual o amor mútuo acaba de
ser convocado; a fim de impedir que, no interior deste santuário espiritual, se
introduza qualquer sentimento de rancor, ódio ou inimizade. Os fiéis, ao
ouvirem a proclamação do sacerdote, devem também abrir, com sabedoria, atenção
e recolhimento, as portas de seus lábios e de seu ouvido à profissão de fé que
de todas as bocas vai ressoar no recinto sagrado.
Credo
Depois que se deram, se não
exteriormente, pelo menos mentalmente, o ósculo da paz, sinal da caridade que
Cristo exigiu como condição primeira e indispensável para o direito de
participar de sua oblação pura, os fiéis são agora convidados a confessar
publicamente sua fé, como demonstração da adesão de sua inteligência à
revelação divina e da aceitação de todas as verdades ensinadas por sua Igreja e
resumidas no símbolo da fé. O que chamamos "Credo" (palavra latina
que significa "Creio") é a "regra de fé" que recebemos dos
Apóstolos e que, como breve resumo das verdades e dos fatos relativos à
salvação, tinha dupla importância: servia externamente como barreira contra os
mestres das falsas doutrinas e, internamente, constituía o fundamento da fé e
da vida dos fiéis. Neste último sentido tomou mais tarde, no símbolo, a forma
de um compêndio de doutrina.
A Antigüidade unia o Credo ao
Batismo: os catecúmenos acabavam a sua preparação recebendo a comunhão do
símbolo da fé, que deviam aprender de cor e depois recitar ao bispo numa
reunião litúrgica pública. Este símbolo batismal era, pois, a expressão solene
da fé apostólica. Esta fé, jurada pelo cristão no batismo, é o seu tesouro mais
precioso e, no mesmo tempo, sua palavra de ordem, a senha que o faz conhecer
por toda parte, como filho da Igreja, como discípulo de Cristo. "Ele
pode", diz Santo Irineu, "nascer e crescer em Esmirna, viver em Roma,
evangelizar nas Gálias, e encontrará por toda parte a mesma fé, será por toda
parte iluminado pelo mesmo sol de Deus".
O símbolo que se reza na
missa é conhecido como símbolo Niceno-Constantinopolitano, ou símbolo dos
Santos Padres, por causa dos dois Concílios Ecumênicos de Nicéia (325) e
primeiro de Constantinopla (381). O Concílio de Nicéia, para combater a heresia
de Ário (arianismo) que negava a divindade do Filho, acrescentou ao símbolo dos
Apóstolos tudo o que concerne à divindade de Jesus Cristo. Mais tarde, o
Concílio de Constantinopla, para combater a heresia de Macedônio (Macedonismo),
que negava a divindade do Espírito Santo, introduziu nele os artigos que se
referem à divindade do Espírito Santo, "que procede do Pai" e
"que falou pelos Profetas".
Foi no decorrer das lutas
confusas contra o Arianismo que o credo entrou na Missa. No começo do século VI
o Patriarca Timóteo de Constantinopla (511-518) "decidiu que seria
recitado de futuro em cada sinaxe", como nos informa um historiador contemporâneo,
Teodoro, o Leitor (que atribui a introdução do credo na Missa a Pedro Foulon de
Antioquia, em 471). No Ocidente, sua introdução na Missa (logo após o
Evangelho) se fez no século nono. Mas enquanto os latinos juntaram-lhe, mais
tarde (século XI), o inciso "Filioque = e do Filho" após "que
procede do Pai", que nenhum texto grego continha, os Orientais
conservaram-no como os concílios o haviam promulgado, isto é, sem o
"Filioqüe, professando, no entanto, a fé dos Santos Padres: que o Espírito
Santo procede do Pai pelo Filho.
O símbolo de Constantinopla é
uma expressão teológica da fé, de uma teologia antiga e sóbria, cujas fórmulas
favorecem, verdadeiramente, a contemplação dos mistérios. Sua recitação
torna-se ainda mais comovente quando é feita por todo o povo. É dele que
escreveu o saudoso Papa João XXIII, em seu testamento: "Entre as diversas
formas e símbolos, por intermédio dos quais a fé procura expressar-se, prefiro
o Credo da Missa sacerdotal e pontifical, da mais ampla e audível elevação, em união
com a Igreja universal de todos os ritos, todos os séculos, todas as regiões,
deste 'Creio em um só Deus, Pai todo-poderoso' até 'e a vida do mundo que há de
vir"'.
Não deixemos o comodismo, a
indiferença, o respeito humano ou uma falsa concepção de progresso científico e
intelectual impedir-nos de confessar nossa fé. Em voz alta, juntamente com
nossos irmãos em Cristo, porque esse mesmo Cristo disse: "Quem me
confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai que está
nos céus; mas quem me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de
meu Pai que está nos céus" (Mt 10,31).
Simbolismo
Enquanto o povo reza o credo,
o sacerdote levanta o véu maior que cobre o cálice e a patena e o agita em cima
das oferendas até "e subiu ao céu". São Germano de Constantinopla diz
que "o sacerdote levanta o véu descobrindo assim as oblatas para
simbolizar o Anjo que revolveu a pedra que vedava a entrada do sepulcro, quando
Cristo ressuscitou; e o agita para figurar o tremor de terra que houve naquela
hora". Este simbolismo é mais claro nas Missas pontificais: o bispo
inclina a cabeça em cima do altar e dois sacerdotes agitam o véu em cima dela
como se fosse Cristo no túmulo. E quando o povo diz: "E ressuscitou ao
terceiro dia e subiu ao céu", param de agitar o véu e o bispo levanta a
cabeça figurando a ressurreição de Cristo. Outros dizem que a agitação do véu
simboliza a descida do Espírito Santo no cenáculo e o vento que abalou a casa
onde estavam reunidos.
Rezemos o credo de coração
alegre e cheio de gratidão porque a graça da fé é um dom inestimável: "A
nossa fé! Eis a vitória que vence o mundo".
Anáfora ou Cânon
Diálogo de introdução
Oração Eucarística (Prefácio)
Santo
Narração da última Ceia e
Consagração
Anamnese
Terceira Oferenda
Epiclése
Comemorações
Conclusão: Doxologia e Bênção
Com o credo termina o
Ofertório e logo começa a anáfora. Anáfora, palavra grega que significa
"elevação", "oblação", é a parte central, a parte
sacrifical por excelência da liturgia; seu correspondente no rito romano é o
"cânon". Inicia-se por um diálogo solene: "Fiquemos
respeitosamente de pé..." e acaba por uma bênção antes da preparação para
a comunhão: "E que a misericórdia de nosso grande Deus e Salvador Jesus
Cristo esteja com todos vós".
Na origem a anáfora não
comportava nenhum elemento variável, mas constituía-se de uma oração
eucarística fixa, na qual enumeravam-se todos os títulos pelos quais, segundo
os dados da antiga Lei, Deus tinha direito a nossa gratidão. Esta enumeração
dos benefícios da Providência terminava pelo maior deles, a Encarnação do Verbo
que, antes de morrer, instituiu ele próprio o sacramento da Eucaristia. Aqui se
fazia a narração da última Ceia.
No Ocidente, provavelmente no
fim do século IV, em Roma e nas Igrejas onde sua influência se fazia logo
sentir, o Cânon começou a admitir variações de acordo com as estações do ano e
as festas dos santos. Como havia leituras (Epístolas e Evangelhos) diferentes
para cada dia, houve sobretudo prefácios variados para cada época do ano litúrgico:
prefácios para o Natal, a Epifania, a Páscoa etc.
No Oriente, ao contrário,
conservou-se o antigo sistema de anáfora única e invariável no ano todo. O tema
da anáfora (Oração Eucarística por excelência) é a Ação de Graças à Santíssima
e Divina Trindade por todos os benefícios recebidos e recapitulados, de certo
modo, no augusto sacrifício.
Ação de Graças a Deus Pai que
nos deu o ser e nos chamou a uma vida eterna e bem-aventurada. Ação de Graças a
Deus Filho que se fez homem, como nós, para nos resgatar e que "na noite
em que se entregou a si mesmo para a salvação do mundo instituiu o grande
mistério da Eucaristia; e do qual comemoramos tudo o que fez por nós: a cruz, o
túmulo, a ressurreição, a ascensão ao céu, a entronização à direita do Pai, a
segunda e gloriosa vinda".
Ação de Graças a Deus
Espírito Santo, implorando sua descida sobre o pão e o vinho para consagrá-los,
e sobre os fiéis, sobretudo os comungantes, para santificá-los (esta é a
epíclese)
A anáfora inicia-se por um
diálogo solene, cuja presença, com algumas variantes, em todas as liturgias
cristãs, sem exceção alguma, mostra bem a sua Antigüidade e importância: ele
representa com o Amém final, o testemunho de que toda a Assembléia está
incorporada na oração por excelência, a Eucaristia.
O sacerdote começa com a
seguinte recomendação: "Fiquemos respeitosamente de pé, fiquemos de pé com
temor; sejamos atentos para oferecer em paz a santa oblação". Fiquemos
como convém ao homem diante de Deus, com respeito e temor mas também com esta
coragem e dignidade espiritual que honra a Deus e nos honra; com a união dos
corações, restabelecida pela paz mútua, sem a qual não se pode elevar até Deus.
Como resposta a este convite,
a Igreja inteira, trazendo em sacrifício o louvor de seus lábios e o amor de
seu coração, diz: "A misericórdia de paz, o sacrifício de louvor".
Insiste-se de novo na
necessidade da paz antes da realização do mistério eucarístico. A esse
respeito, disse São João Crisóstomo, na terceira homilia sobre a Epístola de
São Paulo aos Colossenses: "O presidente da Assembléia, entrando na
Igreja, diz logo: 'Paz a todos'; abençoando, diz: 'Paz a todos'; quando prega a
hora do ósculo, diz: 'Paz a todos'; no fim do sacrifício, nas igrejas, nas
procissões, nas conversas, diz: 'Paz a todos', uma, duas, três vezes e
mais..." Da doce boca de Jesus não saia senão a palavra "PAZ",
"Eu vos deixo a paz. Eu vos dou a minha paz". Aqui não basta que
estejamos em paz, mas o sacrifício, a oferenda que devemos oferecer é a própria
paz não somente entre os homens, mas sobretudo com Deus.
Em seguida, o sacerdote saúda
o povo com uma fórmula tirada do Apóstolo Paulo (2Cor 13,13): "A graça de
nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus Pai e a comunhão do Espírito Santo
estejam com todos vós".
Ao Pai atribui-se o amor, a
caridade, porque, diz São João (Do 4,8), "Deus é Amor". A caridade de
Deus para conosco manifestou-se em ter enviado ao mundo o seu Filho Unigênito,
para por ele vivermos. Esta caridade consiste nisto: não fomos nós que amamos a
Deus, mas foi ele que primeiro nos amou, e enviou o seu Filho como propiciação
pelos nossos pecados.
A graça relaciona-se com o
Filho, segundo estas palavras de São Paulo (Rm 5): "Se pelo pecado de um
(Adão) morreram muitos, muito mais abundantes se derramou sobre muitos a graça
e o dom de Deus, pela graça de um só homem, Jesus Cristo". E São João,
falando do Verbo (Jo 1,14) diz: "Nós vimos a sua glória, glória do Filho
único do Pai, cheio de graça e de verdade... Todos nós recebemos da sua
plenitude, graça sobre graça. Porque a Lei foi dada por Moisés mas a graça e a
verdade vieram por Jesus Cristo".
Do Espírito Santo deseja-se a
sua comunhão, a sua descida em nós como desceu sobre os discípulos reunidos no
cenáculo em forma de línguas de fogo. "Eu derramarei do meu Espírito sobre
os meus servos e sobre as minhas servas, diz o Senhor" (At 2,17). E São
Paulo diz aos Corintios (1 Cor 6,19): "Não sabeis que o vosso corpo é
templo do Espírito Santo, que habita em vós e que recebestes de Deus?"
Estas manifestações externas,
mesmo atribuídas separadamente a cada uma das três pessoas divinas, são de
todas elas juntas, pois as três pessoas são um só Deus.
Retribuída a saudação pelos
fiéis com a fórmula "e com teu espírito", o sacerdote exorta-os a
"elevar os corações ao alto" e eles respondem: "nós os temos
para o Senhor" .
Antes do ofertório fomos já
convidados a deixar de lado toda preocupação temporal para poder acolher o rei
do universo. Agora que este rei está prestes a descer do céu para ser imolado
misticamente por nós, sobre o altar, esqueçamos tudo da terra e levemos nossos
corações para junto de nosso tesouro, Cristo nosso Salvador. "Que
ninguém", dizia São Cirilo de Jerusalém, "esteja aqui de modo a dizer
de boca: 'temos o coração para o Senhor', enquanto seu espírito é tomado pelas
solicitudes deste mundo. Sem dúvida, devemos pensar em Deus em todo momento. E
se isto é impossível à fraqueza humana, procuremos fazê-lo, pelo menos, com
mais concentração e intensidade durante o sacrifício do altar".
"É digno e justo"
A exemplo do Salvador que na
última Ceia, antes de partir o pão e benzer o Cálice, "deu graças", o
sacerdote conclama os fiéis a darem graças ao Senhor; em grego: Eucaristicomen
to Kirio, de onde derivou a palavra "Eucaristia".
A Assembléia reconhece logo e
proclama que isto é digno e justo. Cumprindo o que pediu que os fiéis fizessem,
o sacerdote dá graças a Deus Pai, em nome do povo, "por todos os
benefícios conhecidos e ignorados, manifestos e ocultos", recebidos da sua
bondade; sobretudo pelo envio de seu Filho Unigênito que, enquanto esteve entre
nós, tudo fez para nos levar ao céu a fim de participar de seu reino futuro.
Agradece-lhe, também, a condescendência de aceitar das nossas mãos o sacrifício
que vai oferecer, apesar de ter a seu serviço milhares de arcanjos e miríades
de anjos, os Querubins, e os Serafins...
E em voz alta: "Cantando
o hino da vitória, clamando, bradando e dizendo: 'O povo, completando a frase
do celebrante, canta: 'Santo, santo, santo...'"
Aqui convém ressaltar a
perfeita união, o íntimo entrosamento dos fiéis com o sacerdote nos mesmos
sentimentos e convicções, a ponto de espontaneamente e com ânimo completarem o
que ele lhes sugere.
"Santo, Santo, Santo"
O "Santo" é um hino
que reúne o que o Profeta Isaías ouviu no céu os anjos cantarem quando da visão
em que Deus
o chamou para desempenhar sua função de Profeta (Is 6,3) e o que as crianças e
os filhos dos hebreus gritaram no dia da entrada triunfal de Jesus em
Jerusalém: Bendito seja o que vem em nome do Senhor... .
Neste hino o céu e a terra se
unem para louvar Cristo prestes a descer do céu, para se imolar misticamente na
terra: o céu o acompanha, descendo, cercado pelos exércitos celestes, cantando:
"Santo, Santo, Santo, é o Senhor dos exércitos; o céu e a terra estão
cheios de vossa glória". A terra recebe clamando: "Bendito seja o que
vem em nome do Senhor".
Nenhum texto sublinha tão bem
quanto o "Santo" que a Missa é, antes de tudo, "o sacrifício de
louvor". O que oferecemos a Deus, com Cristo, não são as nossas obras terrenas
às quais pudéssemos atribuir um valor próprio; é sim o louvor, pelo qual
mergulhamos na adoração da divina Majestade, una e trina, esquecendo-nos de nós
mesmos e da nossa vida perecível, para só exaltar a glória de Deus do qual o
céu e a terra estão cheios.
Os quatro verbos usados pelo
sacerdote, no Ecfonema que introduz o hino do "Santo":
"Cantando, clamando, bradando e dizendo", lembram, segundo São
Germano, os "quatro seres vivos" descritos por Ezequiel na sua
profecia por São João Evangelista no Apocalipse. Tinham cada um, além das 6
asas e dos múltiplos olhos, a face de uma águia, de um boi, de um leão e de um
homem; e "não cessavam de clamar dia e noite àquele que estava sentado no
trono: Santo, Santo, Santo, é o Senhor Deus..." (Ap 4,8). Cada verbo
exprimia o som de voz próprio a cada um desses seres.
Aqui o sacerdote tira o
asterisco em forma de abóbada que cobre a patena, e que ali foi colocado no
momento da preparação das oblatas, para lembrar a estrela dos magos que parou
em cima do lugar onde estava o menino recém-nascido. Faz com ele o sinal da
cruz em cima da mesma, beija-o e o coloca de lado.
Após o "Santo"
seguiam, no rito romano, quatro orações de intercessão. Da Ação de Graças a
oração do celebrante passava à petição. No rito bizantino, o que corresponde a
estas orações se reza depois da consagração e da epíclese: comemorações dos
santos, dos mortos, dos vivos e da hierarquia eclesiástica. Esta ordem foi
adotada na nova liturgia romana.
Continuando, pois, a dar
graças, o sacerdote faz a narração da instituição da Eucaristia, na última
ceia, de modo que as palavras da consagração serão apresentadas como sendo
ditas pelo próprio Senhor Jesus.
Convém aqui ressaltar a
maneira com que as palavras sagradas do Salvador são postas em relevo, em
destaque: o sacerdote (que até este momento havia orado em silêncio, levanta a
voz) canta a consagração em meio ao recolhimento atento da assembléia. Em
certos ritos, o parentesco dos idiomas (o siríaco e o árabe são da mesma
família lingüística que o aramaico) permite ouvir estas palavras numa forma
análoga àquela em que historicamente foram pronunciadas.
Em todos os ritos orientais,
depois de cada fórmula consacratória, a assembléia unida clama:
"Amém", proclamando assim a sua fé na transubstanciação que acaba de
se realizar.
dizendo "Amém",
renovamos a nossa fé e agradecemos o grande milagre de amor que, pelas palavras
pronunciadas por um homem fraco como nós, transforma o pão e o vinho no corpo e
sangue do homem-Deus que, todos os dias, desde cerca de 20 séculos, se oferece
em sacrifício por nós sobre os nossos altares.
Anamnese
A anamnese (= recordação) é
uma oração secreta que segue a consagração e pela qual se lembra o Senhor e
seus mistérios, conforme o mandamento que ele mesmo nos deu ao instituir a
Eucaristia: "Faze i isto em memória de mim" (Lc 22,19).
Em todas as liturgias a
narrativa da instituição e a anamnese são duas coisas intimamente ligadas: o
fim da assembléia não é realmente fazer a memória do Senhor, num rito que o
torna presente a ele e aos seus mistérios? Apoiada nas próprias palavras do
Salvador, a Igreja proclama solenemente a realização destes mistérios. Na
Liturgia de São Basílio, a anamnese é mais explícita que na de São João
Crisóstomo, pois começa por reproduzir o próprio mandamento do Senhor:
"Faze i isto em memória de mim. Todas as vezes que comerdes este pão e
beberdes este cálice, anunciareis a minha morte, e confessareis a minha
ressurreição" (1 Cor 11,26), para em seguida acrescentar:
"Lembrando-nos, pois, deste mandamento do Senhor e de tudo o que se
realizou por nós", e imediatamente enumeram-se os mistérios redentores: a
morte na cruz, a sepultura, a ressurreição, a ascensão ao céu, a entronização à
direita do Pai e a segunda e gloriosa vinda.
Em razão destes mistérios
redentores tornados presentes, a Igreja pode oferecer ao Pai, como proveniente
de seus dons mais preciosos "a vítima espiritual", como diz a
liturgia de São João Crisóstomo, ou "o sacrifício perfeito e santo",
segundo as expressões do novo cânon romano.
Aqui o sacerdote eleva o
cálice e a patena formando com eles uma cruz em cima do altar e diz em voz
alta: "O que é vosso do que é vosso, nós vos oferecemos em tudo e por
tudo", querendo dizer com isto que Jesus Cristo presente no cálice e na patena
é, ao mesmo tempo, quem oferece, quem está oferecido e quem recebe a oferenda;
é a vítima e o sacrificador que a oferece por todos, em nome de todos e nas
intenções de todos. O que é vosso, isto é, o Corpo e o Sangue de vosso Filho;
do que é vosso, isto é, do pão e do vinho; nós vos oferecemos em tudo, isto é,
em nome de todas as vossas criaturas; e por tudo, isto é, nas intenções de
todas as vossas criaturas.
Na oração secreta do
ofertório, o sacerdote tinha já expressado este mesmo pensamento:
"Aceitai, Senhor, que estes dons vos sejam oferecidos por mim, vosso servo
pecador e indigno; pois sois vós quem ofereceis e sois oferecido, quem recebeis
e sois distribuído, ó Cristo, nosso Deus" .
Esta fórmula foi gravada em
volta do altar que o Imperador Justiniano colocou na sua basílica de Santa :
"Ó Cristo, vossos servos Justiniano e Teodora, vos oferecem vossos dons de
vossos próprios dons".
A resposta do coro dirige-se
à Santíssima Trindade e foi assim comentada por São Germano de Constantinopla.
"Nós vos louvamos, ó Pai, vos bendizemos, ó Filho, vos rendemos graças, ó
Espírito Santo; e vos suplicamos, ó Trindade Santa, nosso Deus."
Epíclese
A epíclese, tal como se
encontra na liturgia bizantina e em todas as liturgias orientais, é uma
invocação a Deus Pai, para que envie seu Espírito Santo a fim de que este
Espírito Santo transforme os dons e que estes dons santifiquem os fiéis que os
receberão.
O lugar normal da epíclese é
aqui mesmo, após a anamnese, pela qual o sacerdote lembra os mistérios
redentores do Salvador: paixão, morte, ressurreição e ascensão ao céu. Este
último mistério leva naturalmente a recordar o Pentecostes, com a descida do
Espírito Santo sobre os Apóstolos e sua ação invisível nas almas por meio dos
sacramentos instituídos por Cristo.
Por outro lado, na oração
eucarística o sacerdote dirigiu-se a Deus Pai, a quem o sacrifício é oferecido;
quanto ao Filho, ele se ofereceu em vítima a seu Pai, renovando, pela boca do
celebrante, o mistério da última ceia que tomou com seus discípulos; resta o
Espírito Santo, cuja intervenção se invoca, na epíclese, para completar este
mistério, transformando as oblatas e por elas santificando os fiéis.
Aliás, o Espírito Santo
manifesta-se sempre com o Filho e completa sua obra. No dia da anunciação,
desceu sobre Maria e fez o Filho se encarnar no seio da Virgem. No Batismo de
Cristo, desceu sobre ele em forma de pomba e, com sua descida, ouviu-se a voz
do Pai credenciando o Filho para sua missão: "Este é meu Filho muito amado
em que pus as minhas complacências". No dia de Pentecostes, desceu em
forma de línguas de fogo sobre os discípulos reunidos no cenáculo e completou a
obra do Filho na fundação da sua Igreja.
Em todos os sacramentos
destaca-se a ação a ele atribuída: no Batismo, somos regenerados pela água e
pelo Espírito Santo; na confirmação, recebemos o "Selo do dom do Espírito
Santo"; na ordem, o Bispo pede a Deus que encha o futuro sacerdote da
grande graça de seu Espírito Santo; na penitência, o confessor absolve em
virtude do poder recebido do Salvador, quando, depois da sua ressurreição,
soprou sobre os Apóstolos e lhes disse: "Recebei o Espírito Santo. Os
pecados serão perdoados àqueles a quem os perdoardes e serão retidos àqueles a
quem os retiverdes" (Jo 20,22); no matrimônio, é a graça do Espírito Santo
que une os nubentes por um vínculo de amor que só a morte pode desatar; na
unção dos enfermos, o doente é ungido com o óleo santificado pelo Espírito
Santo, enviado pelo Pai; na eucaristia, sua ação não é menor: é ele que, por
sua descida sobre os dons sagrados, os torna fonte de graça e de santificação.
Por isso as palavras da Consagração não se devem separar da invocação ao
Espírito Santo.
A Igreja ortodoxa, baseada em
certos textos dos Santos Padres, afirma que a transubstanciação se efetua pela
epíclese, e não pela consagração. E para reforçar a importância da primeira
acrescentou no século XIII, logo após a consagração, o tropário ao Espírito
Santo: "Senhor, que na hora terça enviastes..." que se reza
habitualmente na quaresma na terceira hora do ofício.
Eis como P. Evdokimov resume
a doutrina da Igreja ortodoxa a esse respeito:
"Antes da epíclese
propriamente dita: 'Enviai o vosso Espírito Santo sobre nós e sobre estes dons
aqui presentes... transformando-os pelo vosso Espírito Santo' . A liturgia
apresenta, desde o início, epicléses prévias, elevando-se gradualmente até a
palavra final. Com efeito, a prótese começa pela oração: 'Rei Celeste,
consolador, Espírito da verdade... vinde e habitai em vós'; a mesma oração está
no limiar da liturgia dos catecúmenos. A oração sobre os fiéis chama 'a graça
do Espírito Santo sobre os dons que vão ser oferecidos', e a oração do
Ofertório: 'Que o bom Espírito de vossa graça desça sobre nós, sobre estes dons
oferecidos e sobre todo o vosso povo"'.
Assim, é impossível isolar o
instante preciso no qual se opera a transformação, pois todo o cânon
eucarístico, pode-se dizer até, a liturgia, desde a prótese representa um só
ato que termina na epíclese... Não se pode fixar senão o momento após o qual o
sacramento é considerado como cumprido: "Eis consumado e cumprido, segundo
nosso poder, ó Cristo, nosso Deus, o mistério de vossa Economia... vimos a
verdadeira Luz..."
Comemorações
O sacerdote, que invocou o
Espírito Santo pedindo-lhe que a participação no sacrifício não seja para os
comungantes causa de condenação, faz a comemoração dos Santos, que por ele
foram santificados, e pede que, pela sua intercessão, este mesmo Espírito Santo
olhe para nós e santifique nossas almas.
Consumado o sacrifício, o
celebrante, vendo diante de si, em cima do altar, o Cordeiro de Deus, prova e
garantia do amor divino para conosco, toma-o como mediador; e, animado pela
presença amiga deste todo poderoso advogado, apresenta a Deus suas petições e
dirige-lhe suas preces com maior e mais firme esperança. Renova agora diante
dos divinos mistérios, já agradáveis a Deus, o seu pedido para que as intenções
comemoradas na preparação das oblatas, e pelas quais orou no momento do
ofertório, sejam atendidas.
A oblação do sacrifício,
porém, não é somente imperatória, mas também eucarística. Por isso, como no
início da liturgia, quando ofereceu a Deus as oferendas, o sacerdote exprimiu
ao mesmo tempo a ação de graças e a súplica, assim também, agora que estas
mesmas oferendas já foram santificadas e consagradas, por meio delas dá graças
e impetra súplicas, expondo os motivos e os objetos de umas e outras.
Para a Igreja são os santos
que constituem os motivos de sua gratidão; é para agradecer a Deus ter-lhe dado
filhos santos que ela oferece este sacrifício espiritual; sua gratidão
manifesta-se especialmente e acima de tudo em honra da Bem-aventurada Mãe de
Deus, a Theotókos, cuja santidade, por um privilégio todo especial, ultrapassa
toda outra santidade criada. Eis porque o sacerdote não pede nada para os
santos; ao contrário, pede-lhes que se unam a ele para reforçar suas súplicas.
Convém aqui ressaltar a
diferença que existe entre os dois elementos da oração de intercessão que segue
a epíclese na liturgia de São João Crisóstomo, a saber: ação de graças dadas a
Deus, por sua obra santificadora na alma dos santos apresentados como
intercessores e a súplica pelos vivos e pelos mortos.
O que demonstra que as
orações referentes aos santos não são de petição mas de ação de graças, é a
presença de Maria no meio deles e de modo destacado; ao contrário de todos os
outros santos, sua comemoração se faz em voz alta e com a participação da
assembléia: "Especialmente a nossa Santíssima, puríssima, bendita e
gloriosa Senhora Mãe de Deus e sempre Virgem Maria".
Não teria sido ela mencionada
ali, se este cortejo sagrado (profetas, apóstolos, pregadores, evangelistas,
mártires etc.) necessitasse de mediação, pois ela está acima de toda mediação
não somente humana mas até dos Anjos, sendo incomparavelmente mais santa que os
mais santos espíritos puros.
Para realçar ainda mais o
lugar de Maria na hierarquia dos dons divinos e para melhor indicar suas
grandezas e suas perfeições, o coro ou a assembléia, ao ouvir o nome da Mãe de
Deus, enlevado pela alegria, canta-lhe um hino de louvor, chamado
"Hirmos". Na Liturgia de São João Crisóstomo, este hirmos é o
"axion estin" (as duas primeiras palavras é (verdadeiramente) justo -
pelas quais começa) na liturgia de São Basílio, o "epi-si-cheire" (ó
cheia de graça); e nas grandes festas do Senhor e da Virgem, o
"megalinarion".
Estes hinos exaltam de tal
modo a Mãe de Deus, a Theotókos, que só eles bastariam para formar uma soma
teológica Marial de elevada poesia. Podemos comprovar isto lendo e meditando
estes Hirmos no "Liturgikon" na parte referente às festas, fixas e
móveis.
O "Axion estin" é
composto de duas partes: a primeira, "É verdadeiramente justo
glorificar-vos ó Mãe de Deus, que sois bem-aventurada para sempre, isenta de
todo pecado e Mãe de nosso Deus", é objeto de uma bela lenda. A segunda
parte: "Sois mais venerável que os Querubins, incomparavelmente mais
gloriosa que os Serafins. Vós que gerastes o Verbo Deus, sem deixar de ser
virgem; a vós que sois realmente Mãe de Deus, nós vos exaltamos", é um tropário,
que serve de antífona para ser intercalada (no ofício de orthros-Laudes), entre
os versículos do canto da Virgem (o Magnificat = Minha alma engrandece o
Senhor).
A lenda a respeito da
primeira parte leva-nos à Grécia, ao Monte Atos (A Santa Montanha), onde desde
o século X florescem inúmeros mosteiros e eremitérios. Num destes eremitérios,
dedicado à Assunção da Virgem, vivia retirado do mundo e do convívio com os
outros monges um eremita de grande virtude, com um jovem discípulo. Um dia, o
velho monge disse a seu filho espiritual: "Hoje quero ir assistir ao
ofício de Vésperas no Grande Mosteiro. Fica aqui e recita o ofício sozinho,
como puderes". Chegada a noite, o jovem noviço ouve bater a porta. Era um
venerável ancião,revestido do hábito monacal, que pedia hospitalidade para a
noite. Na hora do Orthros (Ofício da Aurora = Laudes), o jovem e seu hóspede
foram cantar o Ofício. Quando chegaram ao canto da Virgem, o jovem cantou,
depois do primeiro versículo, a antífona: "Sois mais venerável que os
Querubins...", como era costume, na santa Montanha. Mas, depois dos outros
versículos, o hóspede cantou, antes da antífona habitual, a primeira parte do
"Axion estin" = "é verdadeiramente justo"... Surpreso, o
jovem disse ao hóspede: "Aqui nós cantamos só a 2a parte. Nunca, nem nós,
nem nossos pais, tivemos conhecimento da primeira. Por favor, escreve para mim
estas belas palavras para que possa eu também cantá-las. E como não havia nem
papel, nem tinta, apresentou-lhe a tábua para escrever. O hóspede marcou nela
com o dedo o que acabava de cantar e disse: "É assim que doravante, vós e
todos os Ortodoxos cantareis este hino". E logo desapareceu. Qual não foi
o espanto do jovem ao constatar que as letras estavam gravadas, na tábua, como
se fosse numa cera mole. O hóspede, misterioso, só podia ser o mensageiro da
Anunciação, o Arcanjo Gabriel.
O acontecimento, acrescenta a
lenda, foi logo contado ao velho monge, que o levou ao conhecimento dos anciãos
do mosteiro vizinho. E sem demora a tábua foi enviada ao patriarca de Constantinopla,
que ordenou que, em todas as Igrejas, o "Axion estin" seja cantado
como foi gravado pelo hóspede misterioso.
Freqüentemente nas paróquias,
enquanto o sacerdote faz a comemoração da Mãe de Deus, incensando o altar, um
dos acólitos apresenta-lhe uma bandeja contendo os pedaços de pão que sobraram
da preparação do sacrifício e que serão distribuídos aos fiéis, no fim da
Missa. O sacerdote os incensa e benze. Estes pedaços são chamados evlogias ou
antídoron. Em certas igrejas esta bênção se dá juntamente com a bênção que
conclui a anáfora: "E que a misericórdia de nosso Grande Deus e Salvador
Jesus Cristo esteja com todos vós".
Após a comemoração em voz
alta da Theotókos, o sacerdote faz memória, em voz baixa, dos mortos e dos
vivos, levantando a voz de novo para a comemoração da Hierarquia Eclesiástica,
ou "Os dípticos".
Os dípticos
1.
Etimologia: Palavra grega
composta de dis (2 vezes) e PTIX = folha, tábua para escrever. Dípticos =
dobrado em dois, duplo.
2.
Na Antigüidade pagã: Os antigos
chamavam dípticos a duas tábuas de madeira, metal ou marfim, unidas e
recobertas de cera no interior, de maneira a permitir tomar notas com um
estilete. Na Grécia e na Itália antigas os magistrados, governadores e grandes
do Estado usavam os dípticos, para neles inscreverem o seu nome e a data da sua
nomeação ou eleição e os distribuírem aos amigos como lembrança. Muitas vezes,
a parte externa era enfeitada com desenhos ou esculturas.
3.
Na Antigüidade cristã: Os
primeiros cristãos adotaram esta antiga praxe e serviram-se dos dípticos para
neles inscreverem os nomes dos mártires, dos pontífices, dos reis, dos
benfeitores, dos catecúmenos, das viúvas etc. que queriam mencionar
publicamente na liturgia para que a assembléia rezasse por eles quando o
diácono ou o bispo lia os seus nomes.
O uso dos dípticos
correspondia à obsessão muito humana, das intenções particulares, que sempre
tiveram lugar na oração cristã. Lembremo-nos de que o mártir São Policarpo
rogou aos soldados, quando o vieram prender, que o deixassem acabar a oração,
na qual enumerava todos os que havia conhecido durante a sua longa vida de
nonagenário, "pequenos e grandes, ilustres e obscuros e toda a Igreja
universal espalhada pela face da terra"...; e durante duas horas os
soldados não ousaram interrompê-lo (d. Igreja em Oração, p. 432).
Nos dípticos eram escritos
três grupos de nomes: os santos, os mortos e os vivos, que o diácono lia em voz
alta, ora de perto do altar, ora de cima do ambão (estrado).
A lista dos vivos
compreendia, entre outros e sobretudo, os Papas e Patriarcas unidos pela
uniformidade da fé e pelo vínculo da caridade, e que se nomeavam mutuamente na
liturgia. Os dípticos eram, pois, uma das três maneiras pelas quais se
manifestava a comunhão entre os cinco grandes patriarcas da Igreja, a saber, os
de Roma (o Papa), de Constantinopla, de Alexandria, de Antioquia e de
Jerusalém. As duas outras eram as cartas sinópticas e os apocrisiários.
Quando um patriarca era
eleito, enviava aos quatro outros, com as comunicações da sua eleição, a sua
profissão de fé: era a carta sinóptica. Respondendo-lhe, os outros demonstravam
que reconheciam a legitimidade de sua eleição e o aceitavam em sua comunhão.
Seu nome passava então a ser citado na Missa, no momento das comemorações dos
vivos: era inscrito nos dípticos. O cancelamento do nome nos dípticos
significava a ruptura dessa comunhão.
Quando da sua eleição pelo
sínodo dos Melquitas, em 22 de novembro de 1967, o Patriarca Máximos V
restabeleceu esta prática antiga de "Comunhão pedida" numa carta
enviada ao Papa Paulo VI.
No dia 28 de novembro Paulo
VI enviou ao Novo Patriarca um telegrama assinado por ele pessoalmente, dizendo
entre outras coisas: "... acolhendo de bom grado o vosso pedido de
comunhão eclesial, formulamos votos fervorosos e pedimos ao Senhor que vos
acompanhe com suas graças..."
Além disso os Patriarcas
(sobretudo os de Roma e Constantinopla) trocavam representantes permanentes,
chamados apocrisiários. O Papa São Gregório tinha sido aprocrisiário junto ao
Patriarca de Constantinopla.
A extensão das enumerações,
variável segundo as Igrejas e as circunstâncias locais, fez, sem dúvida, cair
pouco a pouco em desuso esta leitura pública. Atualmente quase todas estas
comemorações são feitas em voz baixa pelo celebrante. O povo, porém, toma nelas
uma certa parte, duas vezes: a primeira cantando o hirmos "Axion
entin" à Virgem Maria, quando da comemoração em voz alta da Mãe de Deus,
como vimos acima. A segunda, quando da comemoração da hierarquia eclesiástica.
Nesta o celebrante faz em voz alta a memória do Papa, do Patriarca e do
Ordinário da diocese (bispo ou arcebispo); e, na liturgia de São Basílio, o
diácono faz também memória do sacerdote celebrante: "Lembrai-vos, Senhor,
em primeiro lugar de B e A..."
O povo responde: "E de
todos e de todas", isto é, lembrai-vos, Senhor, de todos os que estão
sendo mencionados e de todas as intenções pelas quais cada um de nós está
rezando.
Unamo-nos ao celebrante para
rezar por nossos mortos que "adormeceram com a esperança na
ressurreição", pedindo para eles "o descanso onde brilha a luz da
face do Senhor" .
Oremos, também, seguindo a
recomendação de São Paulo a seu discípulo Timóteo (ITm 2,1-4) "por todos
os homens: pelos governantes e por todos os que ocupam cargos elevados, a fim
de que, gozando da sua paz, possamos viver uma vida sossegada e tranqüila, em
toda piedade e honestidade. Porque, acrescenta o apóstolo, isto é bom e
agradável a Deus nosso Salvador, que quer que todos os homens se salvem e
cheguem ao conhecimento da verdade".
Em seguida o sacerdote
conclui a Anáfora por uma doxologia trinitária particularmente solene, pela
qual pede, ao mesmo tempo, a união de todos para a glorificação do santo nome
de Deus. "E concedei-nos que, numa só voz e num só coração, glorifiquemos
e celebremos vosso nome venerável e magnífico, Pai, Filho e Espírito Santo,
agora e sempre e pelos séculos dos séculos."
Pelo "Amém" a
assembléia reforça o pedido do celebrante para que, na Igreja, não haja senão
"uma só fé e um só batismo", como não há senão "um só Deus e um
só mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo, que se entregou como
resgate por todos" (1 Tm 2,5).
Preparação para a Comunhão
Toda a parte da liturgia que
se desenrola depois da Anáfora até os atos manuais simbólicos da elevação, fração
e imisção, inclusive o Pai-nosso, é considerada como preparação para a
comunhão.
Uma pequena ectenia a
introduz e um ecfonema concluindo a "oração da inclinação" a termina.
Entre a ectenia e o Pai-nosso foi mais tarde intercalada a repetição da éticis
que fora dita após o ofertório.
Pai-nosso
Numerosos são os testemunhos
que, desde o fim do século IV, assinalam a recitação do Pai-nosso, entre a
Anáfora e a Comunhão. Por causa da importância e da grande dignidade desta
oração, precede-a, em todas as liturgias, uma introdução pela qual se pede a
Deus que nos torne dignos de ousar rezá-la, pois não é pouca coisa poder chamar
o Criador de Pai.
Os fiéis manifestaram já
"a unidade na fé", recitando o credo; responderam ao apelo
"Amemo-nos uns aos outros", pelo ósculo da paz. Assim, todos podem
agora, com uma última confiança, ter a "audácia" de confessar sua
divina filiação de filhos do Pai.
Pode ser considerado o
"Pai-nosso" como uma preparação comum, essencial e perfeita, para a
comunhão por vários motivos:
1. Porque o Pai-nosso é a
oração dominical, isto é, a oração do Senhor: o próprio Mestre a ensinou a seus
discípulos quando estes lhe pediram: "Senhor, ensinai-nos a rezar, assim
como João ensinou a seus discípulos" (Mt 6,9 e Lc11, 2).
2. Porque o quarto pedido
("o Pão nosso de cada dia nos dai hoje"), entende-se como se
referindo não somente ao pão material, alimento de nosso corpo, mas também e
sobretudo ao "pão vivo que desce do céu, para que não morra quem dele se
alimentar, mas viva eternamente" (Jo 6,50), alimento de nossa alma, ao pão
eucarístico.
3. Porque, não podendo Deus
aceitar o sacrifício, daquele que não está reconciliado com seu irmão ("se
estás diante do altar, e aí te recordares que teu irmão tem algum motivo de
queixa contra ti... vai reconciliar-te primeiro com teu irmão"), o
Pai-nosso faz-nos proclamar que "perdoamos a quem nos tem ofendido".
4. Porque o pedido ligado com
esta reconciliação, "Perdoai-nos as nossas ofensas", constitui uma
purificação imediata de corações (desempenhando e melhor, o papel que tomaram
em seguida neste lugar, certas fórmulas de contrição ).
Rezando o Pai-nosso, falemos
com Deus como os filhos falam com seu pai, porque, conforme diz São Paulo, aos
Efésios (2,18), por Cristo, que na sua carne destruiu as paredes da separação
entre nós e Deus, e as inimizades, recebemos, no batismo, o Espírito Santo no
qual temos acesso ao Pai. E então não somos mais hóspedes nem estranhos, mas
concidadãos dos santos, filhos e membros da família de Deus.
Oração da Inclinação
O Pai-nosso não se conclui
pelo "Amém", mas por uma doxologia de louvor à Santíssima Trindade a
quem pertence o reino, o poder e a glória pelos séculos.
Em seguida, mais uma vez o
sacerdote deseja a paz a todos os fiéis presentes no templo e os convida a
inclinar a cabeça ante o Senhor, em sinal de humilde respeito, de entrega e
abandono nas mãos de Deus. Por mais forte que seja nossa confiança nele, visto
que nos autorizou a chamá-lo de Pai; por mais filial que seja nossa intimidade
com ele, não devemos nunca esquecer nossa condição de criaturas e de criaturas
pecadoras.
A própria Virgem Maria que
Deus elevou à mais alta dignidade que um ser humano pode alcançar, "sendo
a Mãe de Deus", nunca deixou de se proclamar sua serva. "Voltou seus
olhos, disse ela em seu
Magnificat , para a baixeza de sua serva."
E nós, a exemplo de Maria,
após ter chamado Deus de Pai, inclinemos humildemente nossas cabeças diante
dele, e renovemos nossos protestos de submissão e acatamento a seus desígnios
insondáveis.
Enquanto isto o sacerdote,
pela oração secreta "da inclinação", lembra ao Senhor que ele é o
Criador todo-poderoso que tirou todas as coisas do nada para a existência e
pede-lhe que "olhe do alto da sua morada santa para os que inclinaram suas
cabeças diante dele, porque não as inclinaram diante de carne e sangue, mas
diante dele, o Deus temível; e que repartisse os dons sagrados que estão em
cima do altar, entre nós todos, para o bem de cada um, segundo as suas
necessidades particulares, movido pela misericórdia de seu Filho Unigênito e
por seu amor pelos homens... .
Atos Manuais Simbólicos
Após a inclinação das cabeças
e a respectiva oração secreta, o sacerdote conclama os fiéis a "ficarem
atentos" como para ouvir e ver algo de importante que está para acontecer.
E logo cumpre os atos manuais simbólicos. Dá-se este nome a três atos:
elevação, fração e mistura dos dons sagrados, feitos pelo celebrante para
manifestar de modo mais expressivo a imolação de Cristo e a unidade de seu
sacrifício, realizado sob a dupla espécie do pão e do vinho.
Elevação: O celebrante,
segurando com dois dedos da mão direita o "Cordeiro", isto é, a
hóstia grande, eleva-a em cima da patena, bem à vista do povo, fazendo com ela
uma cruz vertical e dizendo em voz alta: "As coisas santas aos
Santos".
Esta fórmula, que estava já
em uso no século IV, significa que os dons sagrados que estão em cima do altar
são santos, pois são o corpo e o sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, e,
portanto, só podem ser recebidos pelos santos, isto é, pelos cristãos que têm a
consciência pura, conforme diz São Paulo: "Examine-se, pois, o homem, e
assim coma deste Pão e beba do Cálice: porque quem come e bebe indignamente,
sem discernir o corpo do Senhor, come e bebe a própria condenação" (1 Cor
11,28).
A Assembléia, impressionada
por estas palavras, clama: "Um só Santo, um só Senhor, Jesus Cristo, para
a glória de Deus Pai. Amém". Como para dizer que nenhum homem, exceto o
"homem Jesus Cristo", pode alcançar por suas próprias forças a santidade
que glorifica o Pai. Eis por que, ainda que pecadores, mas com fome e sede de
justiça, ousamos com a graça de nosso Salvador e Senhor, aproximar-nos para
receber seu corpo e seu sangue, fonte de santidade.
A elevação do Cordeiro se faz
para significar que Jesus Cristo é Rei, Senhor e Chefe; e que Deus "o
exaltou e lhe deu um nome que está acima de todo nome, para que ao Nome de
Jesus todo joelho se dobre nos céus, na terra e nos infernos; e toda língua
confesse que o Senhor Jesus Cristo está na Glória de Deus Pai" (FI 2,9).
Fração: Em seguida, o sacerdote parte o Cordeiro em quatro
partes, segundo os cortes preparados já na prótese, dizendo secretamente:
"É partido e fracionado o Cordeiro de Deus, que é partido sem ser
dividido, que é sempre comido e nunca consumido, mas santifica os que o
recebem".
A fração não tem por
finalidade somente partir o pão consagrado em partículas e facilitar, assim, a
comunhão, mas tem um sentido simbólico: lembrar que Cristo partiu o pão antes
de dá-lo a seus discípulos na última ceia, figurando a entrega de si mesmo por
nós em sua paixão: "Comei, isto é o meu corpo que é partido por vós, para
a remissão dos pecados".
Os primeiros cristãos
davam-lhe tanta importância que "fração do pão" designava a própria
celebração eucarística (cf. At 2,46; lCor 10,16).
As palavras pronunciadas
quando da fração do Cordeiro significam que Cristo é o mesmo ontem, hoje e
pelos séculos. Ainda que seu Corpo seja partido todo dia nos altares, não é
dividido e não padece mais; de modo que os que o recebem na Comunhão o recebem
inteiro em cada partícula.
A fração da hóstia existe em
todas as liturgias. Atualmente parte-se somente a hóstia do celebrante; as que
se destinam à comunhão dos fiéis, ou são partidas com antecedência (na pró
tese) ou são mesmo pré-fabricadas. Antigamente, em Roma, a fração era um ato
importante: os bispos, sacerdotes, diáconos partiam todos os pães consagrados
com vista à comunhão dos fiéis, enquanto se cantava o "Agnus Dei".
Num "Ordo Romano"
antigo do século VIII, consta o seguinte a respeito da fração da hóstia, na
Missa Papal: O Papa eleva o Cordeiro e o primeiro diácono eleva o Cálice;
depois, o Papa parte o Cordeiro e distribui as partículas aos servidores do
templo que as levam aos sacerdotes das paróquias. E quando estes celebram em
suas igrejas, deixam cair esta partícula no cálice antes da comunhão, em sinal
de unidade de fé e de sacrifício. Em seguida, o Papa dá o ósculo da paz ao
primeiro diácono e este ao primeiro Bispo. Depois distribui-se a cada bispo e
sacerdote presente uma partícula do Cordeiro que ele guarda dentro de um lenço
de linho, para, quando celebrar, misturá-la com o vinho consagrado no cálice.
Consignação e imisção
(Persignação e mistura): Das quatro partes do Cordeiro partido, colocadas na
patena em forma de cruz, o sacerdote tira a parte superior, na qual está
marcado o monograma de Jesus (formado da primeira e pela última letra lI); faz
com ela uma cruz em cima do cálice (consignação) e deixa-a cair nele (imisção
ou mistura) dizendo: "A plenitude da fé do Espírito Santo",
simbolizando, assim, a unidade do sacrifício sob as duas espécies.
A mistura, precedida da
consignação do cálice, refere-se, sem dúvida, à comunhão. Simboliza também a
união do Corpo e do Sangue de Jesus Cristo, quando da sua Ressurreição, efetuada
de certo modo no altar.
Água quente ou Zeón
Zeón significa vaso contendo
água quente ou a própria água quente da qual o sacerdote, numa colherinha,
despeja umas gotas no cálice.
O seu uso neste momento da
Missa tem várias explicações: uma delas, inspirada nas palavras do sacerdote
benzendo a água: "Bendito seja o fervor de vossos santos, a todo
momento..." e, despejando-a no cálice: "O fervor da fé, cheio do
Espírito Santo. Amém", é a seguinte: simboliza a fé ardente que devemos
ter na presença de Jesus Cristo, Deus e homem, no Cálice, e o Santo fervor com
que devemos, a exemplo dos santos, nos unir a Cristo, pela comunhão.
Comunhão
Quinonicon (ou Canto da
Comunhão): Durante os atos manuais simbólicos e a comunhão do celebrante, o
coro executa-a lentamente a piedosa melodia do quinonicon (ou canto da
comunhão): O tema desta melodia é um versículo tirado da Sagrada Escritura, e
variando segundo os dias da semana e as grandes festas. Constata-se nele uma
visível adaptação ao mistério ou ao santo do dia.
No rito bizantino, a cada dia
da semana, liga-se a comemoração de um mistério particular, de um santo ou de
um grupo de santos. Assim, domingo é consagrado à comemoração da Ressurreição
de Nosso Senhor Jesus Cristo; 2a feira, aos Santos Anjos; 3a feira, a São João
Batista, o Precursor; 4a feira e 6a feira, ao mistério da Santa Cruz; sa feira,
aos Santos Apóstolos, Taumaturgos e Bispos (especialmente São Nicolau); sábado,
aos Confessores, mártires, todos os Santos e defuntos. Quanto à Virgem Maria, longe
de ser esquecida, é comemorada todos os dias, a todos os ofícios, e
particularmente domingo, 4a feira e 6a feira, em razão da sua participação no
mistério da Redenção (cf. Litúrgica, p. 37).
Comunhão do Celebrante
Enquanto o coro canta o
quinonicon, sacerdote e diácono recitam individualmente as orações
preparatórias à comunhão, que são de grande beleza e servem também para os
fiéis.
Em todos os ritos, o
celebrante, bispo ou sacerdote, é o primeiro a comungar. A comunhão do
celebrante no Precioso Sangue, distinta da Comunhão do Corpo de Cristo, foi
sempre considerada como indispensável à integridade do rito eucarístico (por
isso o celebrante deve comungar em todas as Missas que celebra).
Nas Missas Pontificais, os
sacerdotes e diáconos concelebrantes recebem a comunhão da mão do Bispo, que
lhes entrega, primeiro, a cada um, uma partícula (especialmente consagrada para
isto) na palma da mão direita, colocada em forma de cruz, em cima da mão
esquerda. Depois de comê-la, bebem cada um, três sorvos diretamente do cálice,
segurado pelo bispo.
A fórmula que o celebrante
reza ao receber o corpo e o sangue é bastante significativa: "O precioso e
santo Corpo (ou sangue) de Nosso Deus e Salvador Jesus Cristo é dado a mim
N..., sacerdote, para a remissão dos meus pecados e para a vida eterna".
Depois de comungar do
Precioso Sangue, ao limpar os lábios com o sangüíneo, o sacerdote diz:
"Isto tocou meus lábios, apagou minhas faltas e me purifica de meus
pecados" .
Esta fórmula é tirada de
Isaías. O profeta conta que, quando em visão, viu o Senhor sentado num trono
muito elevado e os Serafins cantando: "Santo, Santo, Santo é o Senhor dos
Exércitos, a terra toda está cheia da sua glória", um dos Serafins voou em
sua direção, trazendo na mão uma pedra em brasa que tinha tomado do altar com
uma tenaz, aplicou-a sobre sua boca e disse: "Tendo esta pedra tocado teus
lábios, teu pecado foi tirado e tua falta apagada". E logo foi-lhe
comunicada a missão que devia desempenhar junto ao povo de Israel (Is 6,1-8).
Simbolismo da Comunhão dos
Celebrantes
Os primeiros que comungam ao
Corpo e Sangue de Jesus Cristo são os sacerdotes, no santuário. Figuram os
Apóstolos a quem o Salvador deu primeiro seu corpo e sangue e comungam sob as
duas espécies separadamente. Esta comunhão dos sacerdotes no santuário figura a
ceia mística de Jesus com os seus Apóstolos, sua paixão, sua morte e seu
sepultamento.
A manifestação da
Ressurreição é figurada pela abertura das Portas Santas no momento em que os
fiéis são convidados para a comunhão. Quando os celebrantes comungam antes da
abertura das Portas Santas, ficam repletos da graça celeste da Ressurreição,
pois estão no sepulcro do Senhor representado pelo altar. Lembram os anjos que,
antes da abertura do túmulo, foram as testemunhas da Ressurreição e anunciaram
o prodígio às santas mulheres.
Estando, pois, como que
iluminados pela luz da Ressurreição, transmitem esta graça ao povo, na abertura
das portas santas, como na abertura do túmulo (P. Couturier, 189 e Maria... p.
99).
Comunhão dos fiéis
O celebrante, segurando o
cálice e a patena, de frente para a assembléia, convida os fiéis para a
comunhão, dizendo em voz alta: "Com temor de Deus, fé e caridade,
aproximai-vos". Neste convite exprimem-se as disposições que cada um deve
ter ao aproximar-se para receber "o pão vivo descido do céu", Jesus
Cristo, o Salvador: "Temor e respeito, fé e amor". O povo manifesta
logo sua alegria e sua fé na presença real: "Amém, amém, bendito seja o
que vem em nome do Senhor. O Senhor é Deus e nos apareceu". E, no caso de
muitas comunhões, acrescenta uma das orações secretas que o sacerdote rezou
para se preparar para a comunhão: "Recebei-me, hoje, participante da vossa
ceia mística, ó Filho de Deus..."
A comunhão sob as duas
espécies vigorou, sempre, como regra nos ritos orientais (não latinizados).
Para comungar, os fiéis recebiam outrora uma partícula do pão consagrado na
palma da mão direita e bebiam diretamente do cálice. As mulheres costumavam
cobrir a mão com um véu.
Razões práticas de
conveniência, como o perigo de entornar o precioso sangue, a repugnância, ou a
ameaça de uma epidemia proveniente do fato de todos beberem pelo mesmo cálice,
foram sugerindo diversas maneiras de comungar sob a espécie do vinho. Assim,
usou-se beber do cálice por meio de um canudinho de ouro, ou o celebrante
verter, com uma pequena colher, uma gota do cálice na boca do comungante; mais
tarde, porém, para evitar todo perigo de profanação, o sacerdote passou a
despejar no cálice as partículas consagradas e a dar assim, a comunhão sob as
duas espécies misturadas com uma colher de ouro. Atualmente pratica-se
geralmente a "intinção", isto é, o sacerdote embebe no precioso
Sangue a extremidade da partícula a ser dada ao comungante.
No Ocidente a comunhão sob as
duas espécies manteve-se até o século XIII. Depois pouco a pouco começou a
desaparecer.
O Concílio Vaticano II
admitiu expressamente a possibilidade do restabelecimento da comunhão também
sob a espécie do vinho, reservando à Sé Apostólica a determinação dos casos
precisos, aos quais isto poderá ser feito, e ao bispo o juízo da sua
oportunidade concreta.
Para os fiéis tomarem
verdadeiramente parte na Missa, não deveria ser isto concebível sem a comunhão.
A cada Missa os fiéis deveriam poder comungar: assim foi o uso apostólico e assim
recomenda a Igreja. Nem a beleza das orações, nem a magnificência das
cerimônias substituem a Comunhão. Se, na Missa, Cristo se oferece em vítima, é
precisamente para que possamos comungar a seu sacrifício, recebendo-o em
partículas consagradas na Missa a que assistimos, conforme a verdadeira
tradição, e não em hóstias antecipadamente consagradas e conservadas no
sacrário, a não ser em casos especiais.
Para se preparar a Comunhão
recomenda-se rezar as comoventes orações litúrgicas que a Igreja faz o celebrante
recitar secretamente: encontramos nelas o correspondente aos atos de fé, de
contrição, de desejo e de amor.
Os fiéis comungam de pé,
aproximando-se em duas filas e fazendo uma reverência acompanhada do sinal da
cruz, antes de chegar até ao sacerdote, e depois de receber o corpo e o sangue
do Senhor. O uso ocidental de receber a comunhão de joelhos começou no século
XIII: correspondia a uma mudança na interpretação das atitudes litúrgicas e
possivelmente também, a uma evolução da piedade eucarística. Pelo Concílio
Vaticano II, foi autorizado o restabelecimento do antigo uso.
A fórmula usada pelo
sacerdote no momento de dar a comunhão aos fiéis requer que ele nomeie cada um
pelo nome do Batismo: "O servo (ou a serva) de Deus N... recebe o santo e
precioso corpo e sangue de nosso Senhor Deus e Salvador Jesus Cristo para a
remissão de seus pecados e para a vida eterna". Por isso, visto a
impossibilidade de o sacertode saber o nome de todos os comungantes, em certas
igrejas cada fiel, ao chegar sua vez de comungar, pronuncia em voz baixa seu
nome, de modo a ser ouvido pelo sacerdote que o repete ao lhe dar a comunhão.
Ação de Graças e Despedida
Terminada a comunhão dos
fiéis, o celebrante dá-lhes a bênção, dizendo: "á Deus, salvai o vosso
povo e abençoai a vossa herança". Porque, conforme diz São Paulo aos
Romanos, todos os que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de
Deus... E, se somos filhos, somos também herdeiros; herdeiros de Deus e
co-herdeiros de Cristo, se é que padecemos com ele, para com ele sermos
glorificados" (Rm 8,14-17).
Recebemos esta bênção como se
a nós tivesse sido dada pelo próprio Senhor Jesus, quando ao subir ao céu
"levantando as mãos, abençoou seus discípulos" (Lc 24,50). Após
ter-lhes dito "recebereis a força do Espírito Santo, que descerá sobre
vós, e dareis testemunho de mim... até as extremidades da terra" (At 1,8).
A resposta da assembléia é
uma verdadeira profissão de fé, cheia de grata alegria: "Vimos a
verdadeira Luz, recebemos o Espírito Celeste, encontramos a fé verdadeira,
adorando a Trindade indivisível, porque ela nos salvou". Enquanto isto, o
sacerdote, no altar, rende uma última homenagem de adoração às Santas Espécies,
com orações e gestos que parecem querer simbolizar a ascensão do Salvador ao céu:
incensa-as dizendo: "á Deus, sede exaltado por cima dos céus, e que vossa
glória se estenda por toda a terra". Em seguida, retoma às Portas Santas,
ostentando o cálice e a patena e dizendo: "Bendito seja o nosso Deus a
todo momento..." e leva-os para o altar da preparação onde se fará a
consumição das hóstias que sobraram e a purificação dos vasos sagrados.
O hino "Sejam nossas
bocas, Senhor, cheias de vossos louvores" cantado pelo coro, inicia a ação
de graças pela participação nos mistérios santos, imortais, puros e
vivificantes, que o sacerdote conclui: "Porque sois nossa santificação e
nós vos rendemos glórias, Pai..." Ao pronunciar o nome da Santíssima
Trindade, faz com o livro dos Evangelhos uma cruz em cima do altar e coloca-o
sobre o Antimênsion, como estava no começo da missa. Ali ficará, dia e noite,
como em cima de seu trono, conforme já vimos. E logo procede-se à despedida dos
fiéis. O sacerdote convida-os a se retirarem junto com ele do templo:
"Vamos em paz", como fez Jesus a seus Apóstolos, após a última Ceia:
"Levantai-vos. Vamo-nos daqui" (10 14,31). E sai do santuário, para,
diante do Ícone do Salvador, rezar a oração conhecida pelo nome de "oração
atrás do ambão", porque se rezava antigamente atrás do ambão (estrado) que
ficava no meio da Igreja diante da iconostase. Nesta bela oração pede-se a
Deus, de novo e pela última vez na liturgia, a santificação e a paz para suas
Igrejas e seus ministros, para os governantes, o exército e todo o povo, porque
somente dele procedem todos dons e dádivas, e ele abençoa os que o bendizem e
santifica os que nele confiam.
(O coro, confirmando as
palavras do sacerdote, bendiz e exalta o nome do Senhor.)
Na Missa de São Basílio,
enquanto o coro exalta e bendiz o nome do Senhor, o sacerdote, olhando para o
altar da preparação, onde agora estão os dons sagrados, reza secretamente a
seguinte oração que resume, mais detalhadamente que na Missa de São João
Crisóstomo, o que foi feito durante a ação litúrgica que chega a seu fim:
"Ó Cristo, nosso Deus, cumprimos, na medida de nossas possibilidades, o
mistério de vossa economia divina: renovando o memorial de vossa paixão e
contemplando em figura a vossa ressurreição; ficamos repletos de vossa vida
infinita e antegozamos vossas inesgotáveis delícias, das quais vos pedimos
tornar-nos a todos dignos do século que há de vir".
E logo dá a bênção à
Assembléia. Não tendo nada a apresentar como sendo nosso que nos possa merecer
a salvação, voltamos nossos olhos para a paternal bondade daquele que é o único
a poder salvar-nos, devido a sua misericórdia e seu amor pelos homens.
Recorremos também a escolhidos intercessores capazes de defender a nossa causa,
ocupando o primeiro lugar a Santíssima Mãe de Deus, pela intercessão da qual
obtivemos já tantas vezes a misericórdia.
Apresentamos a Cristo Jesus,
como advogados nossos, santos da sua maior intimidade e até parentes seus pelo
sangue: Sua Mãe, Maria, seus avós, Joaquim e Ana, seus Apóstolos que ele chama
de "Amigos e filhinhos" (Jo 13,33); e também o padroeiro da Igreja
dentro da qual ele acaba de se oferecer em sacrifício; o autor da liturgia, no
decorrer da qual ele se tornou presente entre nós. Nada é mais sintomático do
lugar que ocupa Maria na piedade bizantina, que as menções que dela se fazem no
decurso da liturgia e de modo especial nos momentos mais solenes, como a
Anáfora e a Comunhão, o que levou um estudioso liturgista a dizer: "Parece
que a Igreja não pode realizar nenhum ato de seu culto sem a ele associar
Maria, ou melhor, sem nele se associar a Maria, como Àquela que é, por
excelência, a associada de Cristo, Àquele por quem todo o corpo místico, em
tudo o que faz, se une a seu chefe" (Maria... p. 98).
Antidórom
Nas liturgias solenes o
celebrante distribui aos fiéis, após a despedida, o antidórom, ou pão bento,
dizendo: "Que a bênção do Senhor e sua misericórdia desçam sobre
vós..."
Literalmente, antidórom
significa "em lugar do dom, em substituição ao dom". O dom aqui é o
corpo e o sangue de Nosso Senhor. Este pão bento destinava-se, primitivamente,
àqueles que não tinham comungado. Eram partes sobrando dos pães (prósfora), que
o sacerdote, na preparação do sacrifício, utilizou para deles tirar as
partículas (Cordeiro e pérolas) necessárias para a Comunhão. Cortadas em
pedaços pequenos, eram bentas, depois da consagração ou antes do hino à Virgem
Maria, "É verdadeiramente justo...", com um simples sinal da cruz.
Todo assistente ao sacrifício da Antiga Lei, assim como aos ritos pagãos,
participava do holocausto. A Igreja primitiva permaneceu fiel a esta lei do
sacrifício. Mas como a recepção do Cordeiro da Nova Lei requer disposições
especiais de pureza e santidade, rapidamente chegou-se à substituição da
comunhão ao corpo e sangue de Cristo pela manducação dos pães dos quais o
sacerdote tirou a matéria do sacrifício.
Este pão bento lembra,
também, as refeições ou ceias fraternais ou de caridade (Ágapes), que os
cristãos tomavam juntos, antes ou depois da celebração da Eucaristia. Devemos
comê-lo com respeito e piedade e levá-los aos que, por motivo justo, não
puderam estar presentes ao Santo Sacrifício, como os doentes e viajantes. Para
marcar a diferença entre a comunhão propriamente dita e a manducação deste pão
bento, o povo dos campos (na Síria e no Líbano) chama o Antidórom "o corpo
de Maria". Receber o Antidórom é receber o corpo de Maria. Esta concepção
popular realça de modo tocante o papel de Maria na Missa e no pensamento dos
fiéis, e une num mesmo sacrifício Filho e Mãe, ilustrando tão bem estas
palavras de Simeão de Tessalônica a respeito da Prótese: "Nela extrai-se o
Cordeiro do pão para recordar que o Verbo de Deus nasceu da Santíssima
Virgem" (Maria... p. 101-102).
É costume, enquanto o
sacerdote faz as abluções e tira os paramentos, o leitor rezar em voz alta as
orações de ação de graças para serem ouvidas pelos que participaram do
sacrifício e receberam o corpo e o sangue de Cristo. Em seguida, os fiéis
retiram-se em paz, levando em seus corações, e em seu espírito, o alimento da
Palavra de Deus e de sua graça, como semente boa que deve germinar, crescer e
manifestar-se em sua vida de cada dia, pelas boas obras, pela prática das
virtudes e pelo cumprimento de seus deveres de estudo; a fim de que, como disse
Jesus, "brilhe a sua luz diante dos homens, para que vejam suas obras boas
e glorifiquem seu Pai, que está no céu" (Mt 5,16).
4. Glossário
Anáfora:
|
do grego, oblação, oferta. Parte da liturgia na qual se
faz a consagração eucarística.
|
Anamnese:
|
do grego, lembrança, memória, parte da anáfora onde se
recordam os grandes mistérios da redenção.
|
Anárgiro:
|
o que trabalha gratuitamente; que renuncia a qualquer
remuneração.
|
Antídorom ou evlogia - (pl.
antídora):
|
dons dados em retribuição; pedacinhos de pão distribuídos
aos fiéis na saída da liturgia.
|
Antífonas (ou típica):
|
do grego, responsório, canto executado alternadamente por
dois coros.
|
Antimênsion:
|
pequena toalha com relíquias colocada sobre o altar sobre
o qual se celebra a eucaristia.
|
Apocrisiário:
|
representante de uma sede patriarcal.
|
Apolitikion:
|
do grego, o que conclui. Tropário principal da festa que
encerra o ofício das Vésperas e das Matinas.
|
Arcano:
|
Mistério que nos primeiros séculos rodeava a celebração
eucarística e os principais mistérios da fé.
|
Cânon: (do grego):
|
na liturgia latina, a parte central da eucaristia que
corresponde à Anáfora oriental.
|
Kondákion:
|
estrofe que encerra uma série de tropários.
|
Didaqué:
|
do grego, doutrina, texto cristão do primeiro século, com
breve resumo da doutrina cristã.
|
Díptico:
|
lista de pessoas das quais se faz memória durante a
liturgia.
|
Dikírion e Trikírion:
|
pequenos candelabros com duas e três velas,
respectivamente, que se cruzam. Usados pelo bispo nas bênçãos, representam as
duas naturezas de Jesus e as três pessoas da Trindade Santíssima.
|
Doxologia:
|
do grego, louvor. Pequeno hino de louvor à Trindade com o
qual se conclui uma oração.
|
Ecfonema:
|
do grego, dito em alta voz, em oposição às orações que se
fazem em voz baixa.
|
Ektenia:
|
do grego, o que é prolongado. Convites à oração por
diversas intenções.
|
Epi-si-cheire:
|
imposição das mãos.
|
Epíclese:
|
invocação do Espírito Santo sobre os dons eucarísticos.
|
Eukaristísomen to kiriou:
|
"agradeçamos ao Senhor".
|
Evlogía:
|
ver antídoron.
|
Glossólago:
|
aquele que tem o dom das línguas ou glossolalia.
|
Hino de Cheruvikón:
|
Hino dos querubins entoado quando as ofertas são levadas
do altar da prótesis ao altar principal para serem consagradas.
|
Hirmós:
|
primeiro tropário de cada ode.
|
Hora do orthros:
|
Oração da aurora, o mesmo que matinas.
|
Iconostase:
|
parede coberta de ícones que separa da nave o santuário,
onde está o altar.
|
lntinção:
|
ação de molhar, no caso, o pão eucarístico no vinho
consagrado.
|
lriniká:
|
do grego, invocações/súplicas pacíficas. Oração no início
da liturgia, das vésperas e das matinas, começando com a expressão: "Em
paz oremos ao Senhor".
|
Issodikón:
|
do grego, canto de entrada.
|
Kinonikón:
|
canto de comunhão.
|
Liturgia dos Pré-santificados:
|
Ofício das Vésperas, em alguns dias da Quaresma, quando
não se celebra a eucaristia, seguido da comunhão solene, com as espécies
consagradas anteriormente.
|
Liturgikón:
|
o mesmo que missal.
|
Makarismo, Makarismi:
|
Bem-aventuranças; anúncio litúrgico das bem aventuranças
proclamadas por Jesus (Mt 5,3-12).
|
Megalinárion:
|
versículo que acompanha o hirmós e os tropários em
algumas grandes festas.
|
Melquitas:
|
cristãos orientais dos patriarcados de Alexandria,
Antioquia e Jerusalém. Foram assim chamados, durante as controvérsias
monofisitas, por causa de sua ligação com o imperador bizantino.
|
Mirófores/Miróforas:
|
aquele(a) que carrega perfumes.
|
Monogenes:
|
Unigênito.
|
Prokímenon:
|
do grego, o que está colocado na frente. Canto antes de
uma leitura bíblica.
|
Prósfora:
|
pequeno pão, do qual se cortam pedaços para serem
consagrados na liturgia.
|
Prótese (altar):
|
pequena mesa destinada à preparação das ofertas e à
consumação das sagradas espécies depois da Liturgia.
|
Sinaptes:
|
do grego, coleta. Ladainha, ou série de convites à oração
em diversas intenções. Ultimamente está sendo usada para indicar a coleta
feita na igreja.
|
Sinaxe:
|
do grego, reunião ou assembléia para celebrar uma festa.
|
Theotókos:
|
Mãe de Deus.
|
Típica:
|
ver antífonas.
|
Triságion:
|
tríplice invocação começando com a: palavra Ághios =
Santo.
|
Tropário ou tropárion:
|
Pequena composição poética da festa em seu tropário
principal ou apolitíkion.
|
Yom kippur:
|
Dia da expiação. Festa judia de penitência.
|
Zeón:
|
recipiente no qual se aquece a água colocada no cálice
antes da comunhão. Essa água fervendo simboliza a fé dos fiéis.
|
Néophyte Edelby, Liturgikón, Ed.
du Renouveau, Beyrouth.
S. Salaville e G. Nowack, Le rôie
du diGere dans ia Liturgie Orientaie, Instituí Français d'Études Byzantines,
ParisAthenes.
N. Gogol, Meditations sur ia
Divine Liturgie, Desc1ée de Brouwer.
P. Evdokimov, La Priere de i'Eglise
d'Orient, Ed. Salvator Malhouse.
J. Nasrallah, Marie dans ia
Sainte et Divine Liturgie Byzantine, Nouvelles Editions Latines.
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